Prêmio Melhores ONGs anuncia as 100 vencedoras de 2021

O destaque do ano e as categorias especiais serão anunciadas no dia 9 de dezembro. Melhores por estado é novidade desta edição, que teve recorde de inscritos

O Prêmio Melhores ONGs anuncia as 100 organizações brasileiras do terceiro setor vencedoras em 2021. Na lista, já disponível em melhores.org.br, é possível conhecer o nome das organizações reconhecidas por suas boas práticas em quesitos como governança, transparência, comunicação e financiamento.

Este ano, apesar da continuidade das dificuldades impostas pela pandemia, o Prêmio teve um número recorde de inscrições: 1033 organizações. “Para a gente, 2021 é um ano muito especial, não só porque tivemos o maior número de ONGs inscritas, mas também por uma sequência de anos com melhorias significativas no nível das inscrições. São organizações cada vez mais profissionais”, afirma Fernando Nogueira, pesquisador da Fundação Getúlio Vargas (FGV), que coordena o processo de avaliação das concorrentes do Prêmio desde a primeira edição. “Ficamos ainda mais alegres se lembramos que este é um ano complicado, que vem depois de outro que já tinha sido difícil. Isso mostra a importância das organizações da sociedade civil, mas também que elas têm tido um reconhecimento dos doadores, das comunidades, das pessoas físicas, das empresas, que a maior parte do Brasil valoriza a atuação dessas organizações”.

A cada edição o Prêmio se torna cada vez mais conhecido no setor. “São duas alegrias: a consolidação do Prêmio e o lançamento dos melhores por estado”, afirma Marcelo Estraviz, diretor do Instituto Doar. Com esse crescimento, a expectativa para as próximas edições é poder ter metodologias cada vez mais apuradas e novas categorias específicas. “Um dia sonhamos que era possível promover o reconhecimento de pessoas e instituições dedicadas a fazer o bem. Hoje já estamos completando cinco anos e cada vez mais animados para os próximos”, completa Cássia Christe, diretora executiva do Instituto O Mundo Que Queremos.

Os destaques nas categorias especiais por tipo de causa e melhor ONG entre todas serão conhecidos durante a cerimônia oficial de premiação, que está marcada para o dia 9 de dezembro, às 18h, com transmissão pelo youtube do Canal Futura. A novidade deste ano é o reconhecimento da melhor de cada estado — além das 100 melhores, já são reconhecidas a melhor de cada causa, as dez melhores de pequeno porte e a melhor entre elas.

Maior Torcida do Brasil
Outra novidade desta edição é que, pela primeira vez, a ONG que levar mais gente para torcer por ela também vai ser reconhecida. É a campanha “Maior Torcida do Brasil”, que convoca as 100 melhores a chamar todos os seus apoiadores para acompanhar a cerimônia de premiação, mostrando também que elas têm muita gente engajada com seus trabalhos.

O Prêmio
O Prêmio Melhores ONGs é realizado pelo O Mundo que Queremos, pelo Instituto Doar e pelo Ambev VOA, com apoio de pesquisadores da Fundação Getúlio Vargas (FGV), do Instituto Humanize, da Fundação Toyota do Brasil e do Canal Futura. Reconhece, desde 2017, o trabalho fundamental prestado pelas instituições não-governamentais no Brasil e também funciona como um farol para orientar doações, alcançando grande visibilidade no setor, na medida em que se consolida como a principal referência em ONGs no país. A intenção, além de reconhecer a relevância dos trabalhos prestados, é incentivar boas práticas, contribuindo também para a melhoria na gestão de todas as participantes, incluindo as que não são premiadas.

Quem gera emprego bom na Amazônia?

Como o desmatamento não produz riqueza sustentável, a população está cada vez mais sujeita a ocupações mal pagas e informais

Um dos mais completos retratos do perfil de empregos e ocupações gerados na Amazônia, recém-publicado em uma sequência de quatro estudos, revela que a falta de um plano de desenvolvimento que use o potencial da biodiversidade para desenvolver a região ameaça não só a própria existência da floresta como afeta a qualidade de vida da população.

Em sete anos, houve uma retração significativa no número de postos de trabalho qualificado e que remuneram melhor. “Precisamos de um projeto de desenvolvimento sustentável, que mantenha a floresta em pé, promova o dinamismo do setor privado e seja capaz de reter os talentos”, afirma o economista Gustavo Gonzaga, professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e um dos autores da série de estudos, publicada pelo projeto Amazônia 2030, um esforço de pesquisa comandado por mais de 60 cientistas para traçar um diagnóstico da região.

Os levantamentos sugerem que, de maneira geral, a agropecuária se expande na região ao mesmo tempo em que mais demite do que contrata, enquanto as ocupações qualificadas na indústria estão em declínio e posições no setor de serviço com menor remuneração dominam as cidades.

Esse cenário é visto com preocupação pelos pesquisadores: confirma que o desmatamento não gerou riquezas duradouras para a região frente à destruição da floresta e que a população está cada vez mais sujeita a ocupações que pagam menos e que costumam ter alto grau de informalidade.

Entre 2012 e 2019, houve uma queda 16% no número de postos de trabalho relacionados à agropecuária (agricultura, pecuária, criação de animais e extrativismo florestal) enquanto a área ocupada pelas atividades de cultivo e pastagens cresceu 8,4% no período, de acordo com dados do MapBiomas, rede de especialistas que monitora as transformações no uso da terra.

As posições diminuíram tanto entre agricultores sem especialização (uma queda de 59%) quanto entre os mais qualificados (redução de 6,7%), o que significa que o fenômeno não se explica apenas pelo possível aumento do uso de mecanização e de novas tecnologias na lavoura.

Também pode haver um componente importante de retorno a maneiras mais rudimentares de cultivo, que exigem maior área de plantio, e de deterioração das condições e relações de trabalho. A taxa de informalidade da atividade é de 85%, acima da média já alta da região (59,4%). Apenas a pecuária apresentou um discreto crescimento na geração de postos (2%).

A ausência de políticas que mirem o desenvolvimento de uma indústria que explore a biodiversidade de maneira sustentável, investindo em tecnologias, fica clara na retração das ocupações qualificadas e de liderança nos últimos sete anos. “Até existem subsídios governamentais para a indústria, mas eles não estão alocados em áreas em que a região tem vocação, como bioeconomia, sempre tendo em mente o desenvolvimento sustentável”, afirma Gonzaga.

O resultado é que muitas são atraídas para a região em busca apenas de incentivos fiscais e não de desenvolver uma cadeia de produção local. Em 2012, as ocupações qualificadas e de liderança correspondiam a 6,5% do total de 10 milhões de vagas na região. Em 2019, esse percentual caiu para 4,8%. A região demitiu, em sete anos, 23,2% de seus cientistas, engenheiros, dirigentes, gerentes de empresa e outros profissionais em cargos de liderança.

Nas regiões urbanas da Amazônia, que mais concentram as atividades que geram emprego e renda para a população, o setor de serviços é o que mais cresce – e já se tornou o maior empregador da região. O número de pessoas ocupadas no setor cresceu 28,3% em sete anos. Mas a notícia não é necessariamente boa. O que preocupa os especialistas é o fato de estarem em expansão atividades que não costumam ser tradicionalmente tão bem remuneradas, como vendas, que registrou aumento de 62,7% nas vagas.

Nesse contexto, o setor público tem uma participação importante na economia da região e já se destaca como um dos maiores empregadores. Em menos de uma década, o número de pessoas contratadas pelo setor cresceu 21%. Entre 2012 e 2019, as áreas em que as contratações mais cresceram foram a de segurança, com as categorias de policiais, bombeiros e forças armadas (45,6%), saúde (40,7%) e educação (8,3%). “O aumento do número de profissionais contratados pelo setor público nessas áreas é bem-vindo porque ajuda a aumentar o acesso da população a esses serviços”, afirma Gonzaga.

“Por outro lado, esses dados revelam uma dependência da Amazônia em relação ao setor público.” Os estados da Amazônia Legal empregam, proporcionalmente, mais pessoas no setor público do que o resto do país: 9,1% dos profissionais empregados na região trabalham para o Estado, ante 8% no restante do Brasil. “Esse é um sinal da falta de dinamismo do setor privado na região.”

Esse amplo retrato do perfil da ocupação da população na Amazônia mostra a urgência de se criar políticas capazes de levar desenvolvimento sustentável de maneira permanente. O desafio inclui atrair pessoas para atividades e setores relacionados à vocação da região e – principalmente – responder como treiná-las para ocupar essas vagas. O desenvolvimento econômico da Amazônia também passa pela educação.

Este artigo foi escrito por Alexandre Mansur e Marcela Buscato e publicado, originalmente, na coluna Ideias Renováveis, da Exame.

Imagem – Manaus: nas cidades, o setor público e o de serviços concentram a maior parte das vagas. Usar o potencial de floresta de maneira sustentável promete um futuro com mais qualidade de vida para a população (A.Paes/Deposit/Divulgação)

Por que precisamos ouvir os indígenas na COP26

Os povos originários são nossa melhor aposta para conservar 80% da biodiversidade que o planeta ainda tem

Quem esteve de olho no noticiário nos últimos meses viu que voltou à pauta do Supremo Tribunal Federal a discussão do Marco Temporal Indígena, julgamento que é central para o futuro dos povos originários no Brasil porque legisla sobre o direito mais fundamental: a terra. Mulheres indígenas de 150 etnias organizaram protestos em Brasília contra o projeto e a COP26, que acontece em Glasgow, está recebendo a maior delegação de lideranças brasileiras da história da conferência. Eles estão lá para pautar a demarcação de terras indígenas e a importância dos povos tradicionais para criar e promover soluções climáticas efetivas baseadas na natureza e nas comunidades que vivem em harmonia com ela há séculos.

Precisamos reconhecer a contribuição desses povos para a preservação ambiental e para isso é fundamental demarcar seus territórios. “Nos colocamos contra falsas soluções baseadas em inovações tecnológicas elaboradas a partir da mesma lógica desenvolvimentista e produtivista que provoca as mudanças climáticas. Criticamos soluções que não reconheçam os povos indígenas e comunidades locais como o ponto central na defesa das florestas, da diminuição do desmatamento e das queimadas, e como essenciais para a garantir que a meta declarada de manter o aquecimento global abaixo de 1,5 graus Celsius”, destaca trecho da mensagem da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) aos líderes mundiais, empresários, gestores públicos e organizações da COP26.

Sônia Guajajara, destacada líder indigena brasileira, conhecida no Brasil e em todo o mundo e coordenadora da APIB, está em Glasgow, numa delegação coordenada pelos assessores estratégicos internacionais, Marcus Vinicius Ribeiro & Zachary Kuipers, do 4H5H MEDIA. “Não há solução para a crise climática sem a demarcação dos nossos territórios”, destaca, lembrando que, comparados às demais terras públicas, os territórios indígenas são os que mais contribuem para o equilíbrio climático. “Então nós precisamos que o mundo inteiro escute o que os povos indígenas têm a dizer”, completa, em entrevista para o novo episódio do podcast Infraestrutura Sustentável.

Os povos indígenas são um exemplo de convivência e de relação de respeito com a floresta e uma riqueza cultural maior que qualquer minério ou produto que podemos extrair das regiões onde vivem. “Preservar os seus direitos é mais importante que qualquer grande obra”, ressalta Sérgio Guimarães, secretário executivo do GT Infraestrutura, uma rede de 40 organizações unidas para debater modelos sustentáveis de desenvolvimento baseados na justiça socioambiental. Ele explica que a floresta é a principal infraestrutura da Amazônia: faz chover na maior parte do Brasil, estabiliza o clima, abriga enorme biodiversidade, garante a sobrevivência dos povos originários e é base para o desenvolvimento do Brasil.

Demarcar os territórios indígenas é importante, mas não basta. “É preciso respeitar o modo de vida dos povos indígenas porque é exatamente ele que garante essa preservação que a gente tanto fala. Se hoje nós indígenas somos 5% da população mundial e conseguimos preservar 82% da biodiversidade que ainda resta no planeta é porque nós temos muito a ensinar. E a sociedade inteira precisa entender, respeitar e se reconectar com a Mãe Terra”. Se queremos continuar vivendo neste planeta, deveríamos aprender com quem faz isso desde sempre. Por sorte, essas pessoas estão dispostas a compartilhar esse conhecimento com o mundo. Se os líderes da COP26 derem a seus representantes o destaque que merecem, todo o planeta ganha.

Este artigo foi escrito por Alexandre Mansur e Angélica Queiroz e publicado, originalmente, na Exame.

Foto: Sonia Guajajara com Principe Charles (APIB/Divulgação)

Evento paralelo da COP26, ClimaX SP reúne executivos e representantes de organizações em São Paulo

Encontro presencial conectou Brasil e Escócia. Confira o que rolou

Desde o início do mês, líderes de todo o planeta estão reunidos em Glasgow, Escócia, para a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP26). Com vários representantes presentes no encontro global, o Brasil tem um imenso potencial para promover negócios e qualidade de vida explorando suas oportunidades de redução das emissões, contribuindo para enfrentar a crise climática e impulsionando nosso desenvolvimento. Quem não foi também pôde participar, nesta terça-feira (9/10), durante o primeiro ClimaX SP, o evento paralelo da COP em São Paulo, realizado pelo Instituto O Mundo Que Queremos.

Cerca de 70 executivos de sustentabilidade de empresas e de organizações que trabalham pela transição econômica para o baixo (ou zero) carbono se reuniram, presencialmente, para uma conversa de alto nível, ao vivo, com quem está na COP26. Participaram, direto de Glasgow, via vídeo, Roberto Waack, presidente do conselho da Arapyaú, Daniel Contrucci, diretor da Climate Ventures, Gustavo Pinheiro, Program Officer do Instituto Clima e Sociedade e coordenador da Convergência pelo Brasil, e Ana Carolina Amaral, jornalista da Folha de São Paulo.

“A ideia do evento surgiu quando percebemos que muitas pessoas e organizações importantes não estavam indo para a COP. E que o Brasil tem um grupo de pessoas muito engajadas no tema do clima, que precisam se encontrar para trocar ideias e inventar soluções”, explica Alexandre Mansur, diretor de projetos da O Mundo Que Queremos. Na falta do momento de encontro propiciado pela COP, decidimos criar nós mesmos esse ponto de conexão aqui no Brasil”, completa.

Os presentes puderam conferir os 30 minutos iniciais do filme “Forest Partners”, produção da Partnership for Forest e do governo britânico, que será lançado em breve. Um dos destaques da noite foi um bate-papo, conduzido por Juliana Causin, jornalista de Um Só Planeta e da Época Negócios, com a participação de Fred Rahal Mauro, diretor do filme, e Marcio Sztutman, diretor da Partnership for Forest.

Segundo Cássia Christe, diretora executiva do Instituto, o evento deu tão certo que vai entrar para o calendário do Mundo em 2022. “Nada substitui esse momento onde as pessoas se encontram, trocam ideias, com calma, sem uma agenda definida, criando relações de confiança que geram parcerias duradouras”.

O evento pioneiro foi possível graças ao patrocínio da Partnership for Forests e do governo britânico e ao apoio de Instituto Arapyaú, Reservas Votorantim, Ben & Jerry, Um Só Planeta, Diageo, Grupo Raia Drogasil, Grupo de Trabalho da Pecuária Sustentável e Convergência pelo Brasil.

Foto: Sidinei Lopes/ Veja mais aqui.

Nós sabemos como preservar a Amazônia

Décadas de experimentação na floresta já mostraram como promover desenvolvimento sustentável. Agora, o mundo todo está disposto a nos apoiar

Em tempos de COP26, está todo mundo mais de olho ainda na Amazônia. O motivo? As consequências do desmatamento e das queimadas na maior floresta tropical do planeta não são apenas dos países onde ela está situada, mas de todo o planeta, que depende dela.

As atuais crises hídrica e energética no Brasil são apenas uma prévia do que a destruição do bioma pode causar e, apesar de não faltarem alertas, segundo dados do Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD), do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia, apenas em setembro, a floresta perdeu, por dia, uma área maior que 4 mil campos de futebol.

Ainda não conseguimos chegar num ponto de inflexão onde paramos a destruição e começamos a regeneração de fato, mas precisamos caminhar para lá.

Por sorte, temos bons trabalhos que nos apontam caminhos. Um grupo de mais de 200 cientistas entregou à ONU um alerta, com importantes recomendações para parar o desmatamento. A diretora de ciências do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), Ane Alencar, faz parte desse grupo de pesquisadores e explica que o documento é um relatório completo que traz, entre outras coisas, algumas proposições sobre para onde podemos ir para garantir o futuro da floresta, baseadas em três grandes pilares.

O primeiro é voltado para a conservação, restauração e remediação de ecossistemas terrestres e aquáticos. Já o segundo diz respeito ao desenvolvimento de políticas de bioeconomia que sejam inovadoras e inclusivas, enquanto o terceiro olha para o fortalecimento da governança e das populações locais. É uma receita completa para o sucesso de um conceito que os pesquisadores chamam de “Amazônia Viva”.

“Precisamos entender que as atividades humanas fazem parte de um processo vivo da floresta, ou seja, não têm valor apenas as atividades econômicas e a geração de riqueza e renda, mas o todo”, afirma Ane Alencar, em entrevista para o novo episódio do podcast Infraestrutura Sustentável, que tratou do assunto.

Ela explica que a Amazônia é um bioma único, formado durante centenas de milhares de anos, e isso em si tem um valor. “A floresta deve ser reconhecida e valorizada por prestar serviços ecossistêmicos, não só para o país ou o continente, mas para o mundo. As atividades econômicas desenvolvidas lá devem apoiar a manutenção da floresta em pé”, detalha.

Ane lembra que a governança precisa favorecer um sistema de participação mais equitativo e diverso para que o conhecimento, seja ele científico ou tradicional, seja valorizado em todos os processos. Fortalecer a relação entre o rural vivo e o urbano também é fundamental, já que grande parte da população da Amazônia hoje vive em centros urbanos. “Por último, reconhecer que a Amazônia é uma meca da diversidade cultural e isso em si tem muito valor”, completa Ane. Essas são boas bases para a criação de um novo modelo de desenvolvimento, mais sustentável.

Qual é o primeiro passo? A sociedade precisa reconhecer que a floresta vale mais em pé do que transformada em pasto. “Eu começo pela sociedade porque é ela quem pode cobrar tanto dos governantes tanto das empresas, setores que precisam estar engajados para viabilizar as mudanças necessárias”, afirma Ane.

As pesquisas sobre o assunto já mostram que essa percepção vem crescendo, mas esses resultados ainda não se transformaram num engajamento efetivo. Esse é o nosso desafio, mas Ane é otimista. “O mundo voltou para um trilho interessante e esse novo rumo, que pensa na redução de emissões (de gases do efeito estufa), vai ajudar a puxar a Amazônia para o caminho da floresta viva”.

A floresta, com sua sabedoria de milhões e milhões de anos, também pode nos ensinar sobre sua própria preservação. Para Ane, uma dessas lições é a de que a diversidade gera riqueza, é ela que move tudo para frente. Outro ensinamento é que cada um tem uma função. Árvores menores, por exemplo, têm um enraizamento mais profundo e acabam trazendo água para outras cujas raízes chegam menos fundo. É assim que precisamos agir, cada ator com suas potencialidades, mas em prol de um objetivo comum.

“Se a gente transforma tudo em uma paisagem de monocultura, perde muito, inclusive a capacidade de resiliência e outras possibilidades de reagir.” Comecemos olhando para a floresta com outros olhos, então. Falamos muito em soluções baseadas na natureza, mas precisamos começar a falar também em estratégias baseadas na natureza. Para manter a floresta viva, não temos que inventar a roda, só olhar para o que ela já construiu e aprender com isso.

Este artigo foi escrito por Alexandre Mansur e Angélica Queiroz e publicado, originalmente, na coluna Ideias Renováveis, da Exame.

Foto: Amazônia: bioma vira foco de discussões sobre o clima (Andre Deak/Flickr)

É possível salvar a carne brasileira de embargos ambientais?

Solução é zerar desmatamento que origina pastagens na Amazônia. Dois novos estudos mostram que não é preciso derrubar nenhuma só árvore para produzir mais

O Congresso dos Estados Unidos recebeu no início de outubro o projeto de lei mais abrangente para barrar a importação de mercadorias que possam ter causado desmatamento durante sua produção. Se aprovada, a proposta, que deve ser votada até novembro de 2022, deve ter grande impacto nas importações – e receitas brasileiras -, principalmente no setor de carne bovina.

O país é o segundo maior produtor mundial e o maior exportador: produz 15% de toda a carne bovina consumida globalmente. A atividade tem importância fundamental para a economia brasileira – corresponde a 32% do PIB do agronegócio e a da 10% do PIB total do país. No ano passado, só para os EUA, foram vendidos cerca de US$ 500 milhões em carnes e couro.

Em setembro do ano passado, oito países europeus – Alemanha, Dinamarca, França, Itália, Holanda, Noruega, Reino Unido e Bélgica – já haviam levantado ameaças semelhantes a dos americanos. Em carta ao vice-presidente Hamilton Mourão, representantes das nações afirmaram que o aumento do desmatamento na Amazônia dificulta a importação de produtos brasileiros.

Com a intensificação dos efeitos provocados pelo aumento de temperatura no planeta nos próximos anos, a tendência é que os países endureçam cada vez mais suas políticas climáticas para tornar sua pegada ambiental mais limpa, o que trará reflexos significativos para os setores exportadores.

A pecuária e o desmatamento na Amazônia estão no centro dessa discussão. A derrubada de florestas é a principal fonte de emissões de gases do efeito estufa no Brasil (44%), e as pastagens para criação de gado ocupam 90% das áreas devastadas na Amazônia – um cenário que pode colocar em xeque as exportações de carne bovina brasileira em um futuro não muito distante. Mas é possível mudar essa trajetória.

Dois novos levantamentos produzidos no âmbito do projeto Amazônia 2030, que reúne um time de mais de 60 pesquisadores para traçar uma radiografia da região, sugerem que não é preciso abrir nenhuma nova área de pastagem na Amazônia para aumentar a produção e atender à crescente demanda mundial por carne.

Recuperar pastagens degradadas e torná-las mais produtivas poderia aumentar o valor da produção pecuária na Amazônia entre 17% e 29%, sem ampliar o desmatamento. A solução passa por promover melhorias nas pastagens já existentes, na nutrição e manejo dos animais, além de melhoramento genético do rebanho e capacitação dos trabalhadores.

Mudar o sistema de produção – para modelos mais intensificados – é outra alternativa. No semiconfinamento e confinamento, o gado cresce em pastos e depois é engordado em currais em tempo parcial (semiconfinamento) ou integral (confinamento).

“A produtividade na pecuária é bastante homogênea na região, com predomínio de um modelo de negócios de produção extensiva, pouco uso de insumos e baixos níveis de produtividade”, escrevem os autores de um dos estudos, Francisco Luis Lima Filho, Arthur Bragança e Juliano Assunção, pesquisadores do Climate Policy Initiative (CPI), organização de análise de políticas públicas. Em resumo: ainda há muito espaço para melhorias e aumento da produtividade.

Investir em novas tecnologias e restaurar pastagens também custa menos do que desmatar. De acordo com um segundo estudo do Amazônia 2030, conduzido pelo pesquisador Paulo Barreto, do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), sem melhorias, seria necessário derrubar entre 634 mil e 1 milhão de hectares por ano entre 2020 e 2030 para atender a um crescimento de até 2,4% na demanda por carne (segundo projeções de mercado do Ministério da Agricultura e Abastecimento).

O custo para abertura dessas novas áreas ficaria entre R$ 950 milhões e R$ 1,63 bilhão/ano. Já reformar apenas 0,37% e 0,64% da área de pasto existente aumentaria a produção nos mesmos patamares e custaria entre R$ 270 milhões e R$ 873 milhões. O custo do desmatamento é maior porque envolve a abertura da área, além do investimento necessário para iniciar a produção.

Recursos para investir na recuperação das pastagens degradadas não são um obstáculo, segundo a análise de Barreto. Os produtores precisariam de um valor entre 3% e 9,5% do crédito rural contratado para a região em 2020. “Embora seja viável técnica e financeiramente produzir sem desmatar, não há garantia de que esta alternativa prevalecerá”, escreve Barreto. “O custo global para aumentar a produção por meio da reforma de pasto é menor, mas os incentivos à destruição da floresta e as barreiras à adoção das melhores práticas podem tornar a opção do desmatamento vantajosa”.

Isso significa que, além de facilitar o crédito, promover qualificação e assistência técnica, é necessário combater os mecanismos que acabam incentivando a abertura de novas áreas, como a regularização de ocupações ilegais de terras públicas. “Os programas de regularização das posses têm sido feitos por meio de doação ou venda de terras por preços abaixo do mercado e resultam em um subsídio indevido”, escreve o pesquisador.

Manter a carne brasileira competitiva no mercado internacional – leia-se imune a embargos socioambientais – envolve esforços de diversas esferas governamentais, assim como de produtores. Mas a indústria da carne também pode dar uma contribuição decisiva para transformar esse cenário. Três grandes frigoríficos brasileiros já se comprometeram em monitorar todos os elos de sua cadeia de produção, para garantir que o gado que compram não tenha passado por fazendas que desmataram. A rastreabilidade completa ainda não é realidade, mas é certo que dela depende o futuro da carne brasileira.

Este artigo foi escrito por Alexandre Mansur e Marcela Buscato e publicado, originalmente, na coluna Ideias Renováveis, da Exame.

Foto: Imagem de Shutterbug75 por Pixabay

Especialistas defendem ação climática conjunta para nova economia

Às vésperas da COP26, Conexão Pelo Clima impulsionou diálogo sobre a ação climática

Representantes de empresas, governos e investidores são unânimes ao defender que é urgente a união de esforços para haja uma ação efetiva de mitigação das mudanças climáticas e a construção de uma nova economia. Esse foi o debate que norteou a terceira edição do Conexão Pelo Clima, que reuniu mais de 700 pessoas de vários países da América Latina entre os dias 26 e 28 de outubro, poucos dias antes da COP26. O evento foi organizado pelo CDP América Latina, Climate Ventures e Instituto O Mundo Que Queremos.

Para Rebeca Lima, diretora executiva do CDP América Latina, todos têm o seu papel no desenvolvimento de produtos financeiros verdes e negócios verdes a fim de que a recuperação econômica caminhe de mãos dadas com a necessidade de interromper a mudança do clima em curso. Já Alexandre Mansur, diretor do Instituto O Mundo Que Queremos, afirmou que essa agenda é um ganha-ganha-ganha, já que gera benefícios para acionistas, empreendedores e sociedade. A análise foi endossada por Daniel Contrucci, diretor da Climate Ventures, que ainda acrescentou que, embora essa nova economia ainda esteja em seus passos iniciais, o movimento está escalando.

Ambição climática na América Latina
“Para ter a possibilidade de um planeta estável para as gerações futuras, a gente precisa agir agora”, afirmou Daniela Lerario, líder brasileira na COP 26, mediadora da primeira plenária, que apresentou experiências de governos, empresas e investidores para mobilizar um desenvolvimento sustentável, resiliente e inclusivo. “Glasgow é a primeira COP a colocar a economia real no centro da agenda, a ação climática está acontecendo e é agora, mas precisamos ser ambiciosos. Não vai ser fácil, mas o mundo já tem conhecimento científico e capacidades tecnológica e financeira para fazer isso”, provocou. “Temos que aprender a ouvir a ciência. Os que não seguem terminam mal e prejudicam os outros. Para enfrentar as mudanças climáticas, temos que trabalhar”, acrescentou um dos convidados internacionais, Cristian Schwerter, Diretor de Planejamento de Águas Andinas, Chile.

A pandemia ajudou a sensibilizar os atores e o trabalho agora é manter essa conexão. Essa é a opinião de Larissa Assunção Oliveira Santos, representante do Núcleo de Sustentabilidade, Energia e Mudanças Climáticas do Governo de Minas Gerais, um dos 10 estados brasileiros que aderiram ao compromisso Race to Zero, que tem como meta neutralizar as emissões líquidas até 2050. “O novo relatório do IPCC foi alarmante, mas também trouxe a informação de que ainda dá tempo, mas ele é curto e temos que ser ambiciosos”, afirmou, reiterando que o momento pede ações de todos os atores.

O mesmo vale para os investimentos. “Ignorar os riscos climáticos é evitar a transparência para os investidores”, afirmou José Pugas, sócio e head de ESG da JGP Crédito. Ele lembrou que é impossível não considerarmos impactos como secas e geadas em áreas onde nunca houve antes e que os tomadores de decisão de alocação de capital precisam perceber que o mundo não vai ser igual ao que era antes. “Estamos num momento de questões existenciais. Nós somos a geração que teve a ‘sorte’ de ter consciência sobre seu papel na mudança de longo prazo no planeta e da sua responsabilidade nesse processo”, pontuou, lembrando que os riscos não podem ser motivo para ignorar a ciência. “Não podemos deixar de ser transparentes só porque temos medo dos resultados. Eles podem nos surpreender positivamente.”

Segundo Daniela Lerario, líder brasileira na COP 26 e mediadora da plenária que apresentou experiências de governos, empresas e investidores para mobilizar um desenvolvimento sustentável, resiliente e inclusivo, para ter a possibilidade de um planeta estável para as gerações futuras, é preciso que ações sejam feitas agora. “Glasgow é a primeira COP a colocar a economia real no centro da agenda. A ação climática está acontecendo e é agora, mas precisamos ser ambiciosos. Não vai ser fácil, mas o mundo já tem conhecimento científico e capacidades tecnológica e financeira para fazer isso”, provocou. “Temos que aprender a ouvir a ciência. Os que não seguem terminam mal e prejudicam os outros. Para enfrentar as mudanças climáticas, temos que trabalhar”, acrescentou um dos convidados internacionais, Cristian Schwerter, Diretor de Planejamento de Águas Andinas, Chile.

A pandemia ajudou a sensibilizar os atores e o trabalho agora é manter essa conexão. Essa é a opinião de Larissa Assunção Oliveira Santos, representante do Núcleo de Sustentabilidade, Energia e Mudanças Climáticas do Governo de Minas Gerais, um dos 10 estados brasileiros que aderiram ao compromisso Race to Zero, que tem como meta neutralizar as emissões líquidas até 2050. “O novo relatório do IPCC foi alarmante, mas também trouxe a informação de que ainda dá tempo, mas ele é curto e temos que ser ambiciosos”, afirmou, reiterando que o momento pede ações de todos.

O mesmo vale para os investimentos. “Ignorar os riscos climáticos é evitar a transparência para os investidores”, afirmou José Pugas, sócio e head de ESG da JGP Crédito. Ele lembrou que é impossível não considerarmos impactos como secas e geadas em áreas onde nunca houve antes e que os tomadores de decisão de alocação de capital precisam perceber que o mundo não vai ser igual ao que era antes. “Estamos num momento de questões existenciais. Nós somos a geração que teve a ‘sorte’ de ter consciência sobre seu papel na mudança de longo prazo no planeta e da sua responsabilidade nesse processo”, pontuou.

Soluções Locais para a Resiliência Climática
Diversas cidades latino-americanas já implementaram medidas de adaptação e mitigação para lidar com os impactos das mudanças do clima e esse foi o foco da segunda plenária do evento. Cidades grandes e pequenas têm bons exemplos a dar. Recife, por exemplo, é uma metrópole com grande vulnerabilidade devido ao risco climático, mas que já está implementando ações para desenvolver a resiliência, com um plano local de ação climática, que foi apresentado pelo Secretário de Meio Ambiente da Cidade, Carlos Ribeiro. “Estamos diante de problemas mundiais, com possibilidades de soluções locais”, destacou. A pequena cidade de Belén, em Costa Rica, também implementou uma iniciativa interessante: uma tarifa de serviços ambientais para preservar o recurso hídrico, visto que a região tem várias nascentes de água importantes para o país. “As mudanças climáticas não são apenas um tema ambiental, mas de desenvolvimento e uma oportunidade de crescimento para os territórios”, pontuou Dulcehé Jiménez Espinoza, coordenadora ambiental do município colombiano.

Bogotá, na Colômbia, é outra cidade que tem passado por transformações importantes e pode servir de inspiração para o resto do mundo, com a implementação de várias soluções baseadas na natureza. “Somos mais de 8 milhões de corações que vivem onde nasce água”, apresentou Luz Amparo Medina Gerena, Diretora Distrital de Relações Internacionais da Prefeitura. “Sabemos que precisamos mudar a forma como nos relacionamos com a cidade, então planejamos uma nova forma de ocupar, viver e produzir no território”, explicou a gestora. “Estamos num momento de grande oportunidade, pois estamos em crise e ela está nos mostrando que precisamos nos unir. Entendemos que o mundo é amplo, mas temos que olhar uns para os outros”, convocou Marco Lobo, coordenador do Observatório de Inovação para Cidades Sustentáveis (Oics), uma plataforma que monitora e organiza soluções para o clima com a missão de inspirar mais pessoas, mostrando que replicar é possível e fomentando políticas públicas. “A barreira é continuarmos isolados, mas está nas nossas mãos transformarmos as nossas cidades”.

Onda Verde
“Para compreender o presente e se preparar para o futuro a gente precisa olhar para o passado”, afirmou Daniel Contrucci, Diretor da Climate Ventures, ao apresentar o estudo A Onda Verde, que reúne a inteligência coletiva de vários especialistas da agenda ambiental, consolida desafios e faz um chamado para empreendedores, investidores, governos, consumidores, marcas e atores do ecossistema de impacto brasileiro protagonizarem uma transformação sistêmica na relação entre negócios, pessoas e meio ambiente. O trabalho será apresentado em Glasgow, mas uma prévia de suas conclusões foi destaque no segundo dia do Conexão Pelo Clima. Apesar do foco nos desafios e oportunidades de negócios para a agenda verde no Brasil, o estudo tem uma lógica que pode ser replicada para outros países da América Latina. “Temos tudo para ser a maior potência verde no mundo, mas precisamos de investimentos pra surfar essa onda”, afirmou o diretor da Climate Ventures.

Bioeconomia vai pautar o futuro do desenvolvimento
As exportações na Amazônia são muito concentradas, mas a lista de produtos que ela pode vender para fora é bem mais longa. A conclusão é do estudo “Oportunidades na exportação de produtos compatíveis com a floresta”, é que a floresta tem potencial para aumentar — e muito — esse valor. “Se o Brasil ocupar 1,3% do mercado global de produtos compatíveis com a floresta, a receita anual será de US$ 2,3 bilhões”, afirmou Salo Coslovsky, Professor da Universidade de Nova Iorque e pesquisador do Amazônia 2030, que apresentou o trabalho no painel que tratou de Bioeconomia. O estado do Pará tem um enorme potencial para se tornar referência mundial nesse setor e um outro estudo, divulgado durante o Fórum Mundial de Bioeconomia, afirma que a renda total gerada com as cadeias produtivas desses produtos pode chegar a R$ 170 bilhões em 2040, um aumento de mais de 30 vezes em relação ao seu valor atual. Como colocar isso em prática? “Incorporando a bioeconomia no planejamento das políticas desenvolvimentistas do estado”, comentou Raul Protázio Romão, Secretário Adjunto de Meio Ambiente do Pará, que também participou da mesa. “Problemas complexos demandam soluções complexas, com multi-atores e multisetores”.

“A bioeconomia ainda é um tema escorregadio, porque não há um consenso sobre o que é. Nosso primeiro desafio é estruturar um conceito que incorpore as características específicas da Amazônia em toda a sua complexidade”, provocou Vanderleia Radaelli, Especialista Líder em Ciência, Tecnologia e Inovação do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). “Para incorporar valor agregado é imprescindível ciência, tecnologia e inovação com uma visão estratégia ambiciosa para curto, médio e longo prazo. Nós temos uma infinidade de possibilidades para ir trabalhando simultaneamente”, sugeriu a especialista do BID. “A oportunidade nunca esteve tão visível quanto agora”, completou.

A promoção de novos negócios certamente está entre as saídas para colocar a teoria em prática. “Quando a gente deixa de olhar a Amazônia como pena e olha como oportunidade de resolver os gargalos, conseguimos gerar soluções para as cadeias produtivas, enriquecendo o ecossistema de produtos, serviços e soluções”, contribuiu Carlos Koury, Diretor técnico do Idesam Conservação e Desenvolvimento Sustentável, quarto convidado do encontro. “Colocar a tecnologia para funcionar a serviço dessas cadeias é uma das formas de melhorar esses ambientes ‘inóspitos’”.

Finanças Sustentáveis para a Ação Climática
“O que vai acontecer com a economia sustentável nos próximos anos?”, provocou a mediadora do último painel Tatiana Assali, Gerente de Programas em Finanças Sustentáveis da SITAWI Finanças do Bem. A pressão para uma economia verde aumentou com a Covid-19 e tem caído no gosto dos investidores da Faria Lima, segundo Victor Tâmega, Gerente Sênior de Investimentos em Infraestrutura da Rio Bravo Investimentos. “Um terço dos 100 trilhões de dólares geridos no mundo já tem algum aspecto ESG”, informou. “A regulação também tem avançado para evitar o greenwashing e é importante estabelecer padrões e quantificações. Estamos caminhando, as pessoas têm ficado cada vez mais conscientes e rigorosas, então temos boas perspectivas para o curto prazo, mesmo que o Brasil ainda esteja meio fora dos trilhos no curto prazo”, observou. No longo prazo, as inovações e investimentos que vão permitir o crescimento respeitando o meio ambiente e as pessoas, devem dominar o mercado. “O Reino Unido lançou uma iniciativa que considera esse desenvolvimento, o que dá uma direção de longo prazo para todo o mundo”, opinou Maud Chalamet, head de finanças verdes do Consulado Britânico no Brasil.

Para Eduardo Taveiro, Secretário Estadual de Meio Ambiente do Amazonas, esse é um movimento que veio para ficar. O problema, segundo ele, é que vivemos um momento de transição, onde o consumo excessivo de carne e de soja, por exemplo, ainda dita os rumos da economia em muitos estados, como Amazonas e Pará, favorecendo atividades ilegais, como a grilagem. “Estamos neste momento em um cenário de tempestade (…), mas essa é uma área com grande potencial bioeconômico. Achar o meio do caminho entre o futuro e o presente talvez seja a agenda mais urgente”, lembrou. Apesar dos desafios, os especialistas acreditam que estamos caminhando para uma economia de baixo carbono, inevitavelmente. “Estamos agora discutindo os meios e a velocidade, mas é para lá que temos que ir”, afirmou Sonia Consiglio Favaretto, SDG Pioneer pelo Pacto Global das Nações Unidas. “Está sendo exigido de cada um de nós, cada um em sua posição, o que eu chamo de ‘habilidade de leitura de cenários’ e o cenário aponta para essa direção”.

Pitchs e rodadas de negócios
Como parte da atividade de curadoria, a programação foi ainda uma oportunidade para que startups fossem apresentadas a possíveis investidores e financiadores, com a apresentação de pitchs das startups finalistas da Competição Global de Novos Negócios Verdes (Brasil) e das rodadas de negócios, realizadas pela primeira vez online no último dia do evento, Os encontros entre startups com soluções boas para o clima e empresas e governos interessados nessas inovações, tiveram a participação de mais de 120 iniciativas, número recorde de inscrições.

Imagem: reprodução/ Hybri

A transição para a economia de zero carbono é um jogo de ganha-ganha-ganha

Edição online da maior feira de negócios pelo clima da América Latina mostra os benefícios para empresas, investidores e, principalmente, os cidadãos

A transição para uma economia de zero carbono é um processo ganha-ganha-ganha. Isso porque nela as emissões de carbono na atmosfera são reduzidas gerando: negócios; segurança climática que, consequentemente, reduz as mudanças climáticas e os impactos ambientais que atingem a todos nós; e mudanças nas formas de consumo da população. Esses três pontos inspiraram e criaram oportunidades para pessoas se encontrarem e explorarem todos esses ganhos.

Esse é o foco da Feira Conexão Pelo Clima, um evento que conecta pessoas envolvidas na geração de negócios e financiamento para a transição de uma economia de baixo carbono, explorando o aspecto de ganhos. As inscrições para a 2º Feira Conexão pelo Clima e Summit Climate Ventures, que vai acontecer nos dias 26, 27 e 28 de outubro, estão abertas. O evento estará dividido em quatro grandes eixos temáticos: (I) Finanças sustentáveis e inovação; (II) Bioeconomia; (III) Governos locais e ação climática; (IV) Ambição climática.

Finanças sustentáveis e inovação representam a promoção de fundos que invistam em ações, empresas e iniciativas zero carbono. Estamos vivendo mudanças climáticas com efeitos extremos em todo o planeta, com consequências como secas e destruição da vida marinha. Promover ativos verdes reduz as emissões, a incidência desses eventos extremos e aumenta a nossa segurança. Também reduz a vulnerabilidade dos negócios que são financiados.

Se você investir em empresas elétricas que têm uma matriz que não depende tanto de petróleo e de outras fontes fósseis que podem sofrer boicote ou regulação, seu investimento será mais seguro. Se você promover negócios de transporte, que também emitem menos, eles também serão menos vulneráveis a obrigações, punições e regulações. Os negócios que emitem menos são mais resistentes a boicote de consumidores, pressões de outros investidores, ou até mesmo limites impostos por acordos de países.

Além disso, investir nesses ativos é bom para todo mundo, inclusive para nós que estamos usufruindo dos serviços que esses ativos estão provendo e para nós como investidores involuntários. Os fundos de previdência, por exemplo, são os maiores investidores globais. Se temos um fundo de previdência, é importante que esses fundos invistam em ativos com menor risco climático pela nossa segurança e aposentadoria.

O segundo eixo da Feira Conexão é a Bioeconomia, tema particularmente importante para o Brasil. Diferente de outros países, onde a maior parte das emissões estão em setores como geração de energia e transporte, no Brasil metade das emissões vêm de desmatamento e um quarto das emissões vêm de agropecuária, emissões da criação de gado ou do tipo de manejo do solo.

Sendo assim, a bioeconomia que usa a floresta de forma inteligente é fundamental para os países ricos em floresta, onde o desmatamento é a maior parte do problema das emissões.

A bioeconomia é uma oportunidade de ganha-ganha porque promove a geração de negócios baseados na produção a partir da floresta em pé. Começando por produtos que já existem e já geram negócios, como o cacau, açaí, palmitos, óleos vegetais, madeira sustentável, pesca e muitos outros.

Existe um potencial já aproveitado no Brasil, mas potencializar a bioeconomia, que é riquíssima, gera sustento para quem está vivendo da floresta em pé e gera uma economia de produtos da bioeconomia brasileira, produtos típicos do país com marcas locais que fomentam espaço no mercado internacional e para nós, consumidores, oferece produtos mais gostosos, saudáveis e diversos.

O terceiro eixo da Conexão pelo Clima é o que os governos locais podem fazer. Governos locais são uma chave muito importante para a transição para uma economia de baixo carbono porque muitas das ações para redução das emissões passam por decisões que estão no âmbito de prefeituras, governos estaduais e províncias. Isso fica muito claro quando você pensa em transporte, que são basicamente decididos por prefeituras e estados.

Reduzir as emissões significa investir em mais e melhores transportes: mais metrô e mais trens, chegando em mais lugares, com mais estações. Significa uma maior otimização das vias de trânsito, para que a população fique menos tempo em congestionamentos, queimando combustível. Esses investimentos são incentivos ao desenvolvimento de bairros planejados para que você faça a maior parte dos deslocamentos a pé, com trajetos curtos. Tudo isso melhora a qualidade de vida das pessoas com menos tempo desperdiçado.

A criação de áreas verdes é outro dos muitos aspectos que os governos podem trabalhar. As áreas verdes reduzem os aquecimentos das cidades, a necessidade de ar condicionado, melhoram o conforto e aumentam a resiliência climática. As mudanças climáticas já estão acontecendo e a frequência de seus efeitos aumentar. Já existe carbono na atmosfera que garante mudanças no clima por, pelo menos, mil anos, o que não sabemos é a gravidade disso.

Estamos lutando para segurar as consequências mais devastadoras e manter o aquecimento na faixa de 2ºC, que é considerável o administrável. Deixar as cidades mais protegidas para as mudanças climáticas que já estão acontecendo e estão por vir, significa melhora na qualidade de vida dos cidadãos.

O quarto eixo do evento é Ambição Climática, o que significa o Brasil ter coragem para assumir metas ambiciosas. Desde os anos 1990, quando o país se ofereceu para hospedar a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, a Eco-92, o Brasil é um dos maiores líderes do mundo na negociação do clima. Nossos negociadores são habilidosos, treinados e têm conhecimento científico para embasar isso.

Esse papel de liderança garantiu a vantagem dos nossos interesses serem colocados em acordos internacionais. Por exemplo, o Brasil foi o país que criou o conceito de responsabilidades comuns, porém diferenciadas. Conceito que norteou o Protocolo de Quioto, que está em vigor até hoje. Os países desenvolvidos que se industrializaram no século XX emitindo muito mais carbono, presente na atmosfera até hoje, têm mais responsabilidades de compensação do que os países em desenvolvimento. Além disso, países desenvolvidos têm recursos e fundos para apoiar os países em desenvolvimento.

O Brasil deixou de ocupar essa posição de liderança dentro de negociações internacionais em 2018, quando o governo tirou o corpo diplomático do país das negociações e deixou de aproveitar o papel de liderança que sempre teve. Então, ambição climática é uma oportunidade para o Brasil retomar esse papel de liderança. O que ajudaria o país a usufruir de benefícios e investimentos.

A maior parte dos apoios internacionais para o desenvolvimento em organizações multilaterais estão hoje subordinados a critérios climáticos. Um país como o Brasil que tem uma matriz energética limpa e a possibilidade de reduzir suas emissões facilmente, pode usufruir de uma maior ambição climática e com isso ganhar peso e competição internacional.

Na 2º Feira de negócios Conexão pelo Clima e Summit Climate Ventures os quatro macrotemas do evento vão ser amplamente explorados através da discussão sobre boas práticas e oportunidades em clima, inovação e empreendedorismo.

O evento realizado pelo CDP Latin America, pela organização O Mundo Que Queremos e pela Climate Ventures, será online, gratuito e vai acontecer nos dias 26, 27 e 28 de outubro. Sendo o último dia dedicado para rodadas de negócios: um encontro entre startups com soluções boas para o clima e empresas e governos interessados nessas inovações. A inscrição e mais informações sobre a feira estão disponíveis no site.

Este artigo foi escrito por Alexandre Mansur e Larissa Magalhães e publicado, originalmente, na coluna Ideias Renováveis, da Exame.

Foto: Feira Conexão pelo Clima: evento reúne empresas, investidores e governos (Camila Cecilio/Conexao pelo Clima/Divulgação)

Crise hídrica é o preço que pagamos pelo desmatamento

Para especialista do ITA, momento crítico era anunciado. Reverter o problema exige aprender com o passado e pensar em soluções também para o longo prazo

Estamos vivendo uma crise hídrica e energética sem precedentes. A bandeira vermelha já virou o “novo normal” e os especialistas não são muito otimistas quanto a possíveis novos aumentos nas contas de luz e racionamentos de água. No entanto, apesar dos constantes alertas sobre a relação inegável dessas crises com o desmatamento, a cada novo levantamento, a área desmatada da Amazônia, maior floresta tropical do mundo, só cresce. Os últimos estudos alertam, inclusive, para o risco de ela virar uma savana. A falta de chuvas é apenas uma consequência disso.

“Precisamos lembrar que essa é uma crise anunciada”, afirma o professor do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), Wilson Cabral, que participou do novo episódio do podcast Infraestrutura Sustentável, que voltou a tratar do assunto. O especialista afirma não ter dúvidas de que esse já é o preço que estamos pagando pelo desmatamento. “Eu não diria só da Amazônia, mas a degradação de ecossistemas de forma generalizada”. Ele lembra que a Amazônia é peculiar, porque quando derrubamos a floresta estamos prejudicando também os rios voadores, cuja umidade é distribuída também para outras regiões. “Isso está relacionado com a agricultura, os níveis dos rios, o abastecimento dos reservatórios das hidrelétricas, precipitações, todos os usos possíveis e imagináveis da água”. A agricultura depende da floresta mas, em muitos casos, tem sido a grande vilã do desmatamento, o que Wilson Cabral descreve como “um ciclo vicioso” ou “uma retroalimentação negativa”. Ele explica que à medida que a agricultura avança e o desmatamento também, a atividade cria dificuldades para ela mesma, além de para toda a sociedade.

O que podemos fazer para reverter, ou pelo menos não piorar, essa situação num momento em que as mudanças climáticas estão cada vez mais presentes para cobrar essa conta? Antes de responder a essa pergunta, Wilson Cabral diz que é fundamental lembrarmos porque não fizemos algo antes, o que para ele está relacionado ao fato de que, até muito pouco tempo atrás, não se pensava a longo prazo. Assim, como os efeitos do desmatamento não eram sentidos de forma tão imediata, a sociedade foi investindo em modelos de produção e consumo acelerados que nos trouxeram até aqui. “Agora não temos mais tempo a perder e as ações precisam ser emergenciais”, afirma. “O tempo urge e não há mais esse alongamento entre o tempo da causa e do efeito. Como diz a Greta Thunberg, precisamos lembrar que não há planeta B”, completa.

Acontece que o que nós fizermos hoje, para o bem ou para o mal, também vai levar um tempo para gerar resultados. Por isso mesmo, Wilson Cabral acredita que precisamos olhar para o longo prazo. Ele exemplifica: estamos vivendo uma crise hídrica que, pela nossa matriz energética ser muito dependente das hidrelétricas, também significa uma crise energética. Para lidar com o problema, o acionamento de termelétricas tem sido considerado uma boa ideia. Mas essa ação tem um efeito de retroalimentação negativo muito importante, pois aumenta o lançamento de carbono na atmosfera, intensificando o impacto climático que ajudou a gerar esses períodos de seca prolongados, que geraram a crise hídrica. Ou seja, precisamos ser mais inteligentes que isso e pensar em soluções que gerem mais co-benefícios e menos impactos sobre o próprio modelo.

A transparência na gestão dessas crises é um fato importante nesse contexto. A sociedade precisa saber a gravidade da situação e tudo o que está sendo feito, pois será ela a principal afetada por qualquer decisão. Wilson Cabral destaca que as previsões de precipitações para os próximos meses não são otimistas e medidas para isso já deveriam estar sendo tomadas agora. “Não campanhas para as pessoas tomarem menos banho, mas medidas concretas, inclusive em termos de eficiência energética e redução de consumo por outros atores (como a indústria)”, afirma. Ao mesmo tempo, precisamos investir em soluções que tenham resultados no médio e longo prazo, como fazer a restauração ecológica de bacias hídricas e zerar o desmatamento, não só da Amazônia, mas também de nossos outros biomas. Tudo isso também pede planejamento e integração de agendas, pois todos os atores precisam fazer suas partes. Se não, continuaremos vivendo a crise e contribuindo para agravá-la.

Este artigo foi escrito por Alexandre Mansur e Angélica Queiroz e publicado, originalmente, na coluna Ideias Renováveis, da Exame.

Evento referência em negócios pelo clima abre inscrições para edição 2021

Em sua terceira edição, Conexão Pelo Clima será online nos dias 26, 27 e 28 de outubro. Rodadas de negócios estão entre as novidades deste ano

O mundo todo está se preparando para a 26ª Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP 26), que acontece em Glasgow, em novembro. Lá, representantes de cerca de 200 países farão a revisão do acordo para mitigação das emissões de gases de efeito estufa (GEE), o que será fundamental para avançar na agenda do clima e acelerar a transição para a descarbonização. O Brasil e os países da América Latina precisam ser protagonistas dessa mudança, com metas mais ambiciosas e negócios que caminhem nessa direção. Um dos principais pontos de encontro entre empresas, investidores e governos protagonistas da transição para o baixo carbono é a feira de negócios Conexão pelo Clima. Já estão abertas as inscrições para a edição deste ano do evento: a terceira edição do Conexão Pelo Clima – 2ª Feira Latino-Americana de negócios pelo clima e Summit Climate Ventures -, que acontece nos dias 26, 27 e 28 de outubro, em formato online.

Destaques desta edição, as rodadas de negócios LatAm, que vão acontecer no dia 28 de outubro 100% online, serão oportunidades para parcerias de impacto positivo entre empresas, governos e startups, a partir de modelos de negócios bons para o clima. Elas terão o formato de rápidos encontros empresariais online, nos quais as empresas serão colocadas frente à frente, com horários previamente agendados, em mesas de negociação individuais, de acordo com cada necessidade e perfil de atuação. Outra novidade da edição 2021, será o espaço para que startups sejam apresentadas a possíveis investidores e financiadores, com pitchs durante o evento, que pretende, com isso, também destacar que o empreendedorismo pode ser um caminho para soluções que trarão benefícios para a sociedade ao adaptar e mitigar os efeitos da atual crise climática.

Empresas, governos, empreendedores e sociedade civil estarão convidados a atuar de forma proativa na proposição de soluções alternativas possíveis e viáveis para promover a redução das emissões de GEE com metas baseadas na ciência. Serão quatro painéis que vão abordar boas práticas e oportunidades em clima, inovação e empreendedorismo para a transição para uma economia carbono zero e um desenvolvimento mais sustentável, justo e inclusivo para a América Latina no contexto pós-pandemia.
O evento será realizado via Hybri, uma plataforma digital interativa. Alguns nomes importantes, nacional e internacionalmente, já estão confirmados como participantes dos painéis. Entre eles: Sonia Consiglio Favaretto (SDG Pioneer pelo Pacto Global das Nações Unidas), Salo Coslovsky (Amazônia 2030), Cristian Schwerter (governo do Chile) e Natalie Unterstell (Instituto Talanoa de Políticas Públicas) entre outros nomes importantes da área.

As inscrições para os painéis e rodadas de negócios já podem ser feitas no site: https://conexaopeloclima.com.br/, onde você também pode conferir a programação completa.

Conexão Pelo Clima
Iniciativa inédita na América Latina, a primeira edição da Feira Conexão Carbono Zero, realizada em 2019, foi um sucesso e se consolidou como um evento referência de negócios pelo clima. Após a primeira edição, ganhou um novo nome: Conexão Pelo Clima, fruto da parceria entre o Instituto O Mundo Que Queremos, CDP Latin America e Climate Ventures, que se juntaram para oferecer um espaço único de conexão rumo à uma economia de baixo carbono. A edição 2021 é a terceira edição da feira, a segunda online, e acontece com patrocínio do Instituto Clima e Sociedade (iCS) e da Cargill.