A tragédia ambiental do Camp Fire, o maior incêndio florestal da história da Califórnia, não deve ser confundido com desmatamento
Não se iluda com incêndio florestal que arrasou grandes porções de floresta na costa Oeste americana. É uma das maiores tragédias ambientais do país. O incêndio, chamado Camp Fire, entrou para a história como o mais mortal e destrutivo de que se tem registro na Califórnia. Também foi o incêndio florestal com mais mortes nos EUA desde 1918. As perdas humanas e os prejuízos materiais não têm tamanho. Mas os incêndios de lá não significam o mesmo que as queimadas que destroem nossas florestas no Brasil. São fenômenos inteiramente diferentes em suas causas e consequências. Diferentemente dos brasileiros, os americanos protegem suas florestas.
Os bosques temperados que queimam na Califórnia são completamente diferentes da luxuriante floresta tropical que o Brasil vem perdendo ano a ano. As florestas americanas são praticamente homogêneas, formadas por uma dezena de espécies de pinheiros. O fogo é uma ocorrência natural. Bem manejado, ele ajuda as árvores mais antigas a se livrarem de pragas. Antes dos colonizadores europeus chegarem, quando o Oeste era só terra de índio, os incêndios ocorriam natural e regularmente. A regularidade deixava menos madeira disponível para queimar de cada vez.
A tragédia californiana é o resultado de alguns fatores. Três deles se destacam. Primeiro, as pessoas estão construindo mais casas dentro da floresta. A maior interação humana com as árvores inflamáveis aumenta o risco de início de incêndio. Além disso, com mais propriedades perto da floresta, cada incêndio é rapidamente suprimido, aumentando o acúmulo de galhos e arbustos, que oferecem mais combustível para um grande incêndio descontrolado. E os moradores, com casas mais próximas da mata, resistem à prática de queimadas preventivas. Por cima disso, há as mudanças climáticas, que aumentaram o período e a intensidade da estiagem na Califórnia.
O fogo da Califórnia, porém, não vai necessariamente contribuir para o aquecimento global. Isto porque, depois da tragédia, a área florestal tende a se regenerar. Ninguém vai grilar as terras para pastagens ilegais. E ao crescer a floresta irá absorver de volta o carbono emitido nos incêndios.
Com os incêndios e tudo, as florestas americanas estão resistindo. Desde 1760, quando começou a expansão agrícola dos colonizadores europeus em território americano, até 1920, quando a industrialização ganhou velocidade, o país perdeu 20% de sua área florestal. Depois disso parou. Desde 1920 até hoje, a área de florestas dos Estados Unidos é praticamente a mesma. Cresce cerca de 0,5% num ano ou diminui no outro. Os dados são do Serviço Florestal americano, que monitora a cobertura florestal ano a ano, estado por estado. Mas as imensas extensões de florestas preservadas ou manejadas para produção de madeira se mantêm.
É um exemplo importante para quem acha que o desmatamento tem alguma relação com o desenvolvimento. Ao contrário, os americanos viraram a maior potência do mundo depois que pararam de destruir suas florestas.
Enquanto os americanos pararam a devastação há exatamente um século, depois de cortar apenas 20% de suas florestas, os brasileiros seguem firme no rumo da própria destruição. A Mata Atlântica teve mais de 95% de sua área devastada. As florestas do cerrado perderam 30% da área total. E a Amazônia já tem 20% de destruição acumulada desde os anos 1970.
Pesquisas mostram que os brasileiros em peso querem proteger o que restou de nossas florestas. O poder público e as empresas do Brasil devem atender a esse sábio clamor popular.
O modelo americano de desenvolvimento está em voga outra vez nos altos círculos do poder brasileiro. Se é que realmente saiu de moda em algum momento. Ótima oportunidade para aprendermos alguma coisa com os países ricos em dinheiro, em floresta e em juízo.
Foto: INCÊNDIOS: Imagem de satélite da Nasa, agência espacial americana, mostra as chamas do Camp Fire / NASA (/)