Compro sua fábrica usada (e o lixo também)

A startup brasileira que reinventou o negócio de revenda de máquinas e resíduos industriais em 122 países 

Você já se perguntou para onde vão as máquinas que deixam de ter utilidade para uma indústria? Uma cleantech brasileira viu sua receita crescer 315% em 2020, após identificar uma oportunidade de mercado preciosa ao buscar respostas para essa pergunta.

Não, não estamos falando simplesmente da reciclagem que converte materiais como o aço em matéria-prima para, futuramente, serem usados para fabricação de novos equipamentos ou produtos. A inovação da plataforma brasileira OSucateiro.com é propiciar um ambiente virtual seguro e rápido em que vendedores e compradores de estoques obsoletos possam negociar. Isso significa que se uma indústria tem uma máquina encostada e que poderia simplesmente virar sucata, pode revendê-la online para quem precisa.

Rafael Davi Valentini, CEO do OSucateiro.com, explica que a mera implementação de um novo método de agir dentro das indústrias é a prova de que a ideia está dando certo. “Estamos implementando tecnologia em um mercado ainda com muita operação manual. Hoje, já temos em média 350 mil visualizações mensais na plataforma. É o mesmo que tivéssemos uma loja com 11 mil pessoas circulando à procura de algum produto para fazer negócio. Então, o produto que antes era obsoleto, hoje está em uma vitrine mundial”.

OSucateiro.com já contabiliza acessos vindos de 122 países e é uma das 12 mil organizações, em todo o mundo, aceitas pela ONU para atuar em defesa do desenvolvimento sustentável. Entre obsoletos e resíduos, já foram vendidos mais 200 mil produtos desde o início das operações da plataforma, o que gerou uma quantidade superior a 5 mil toneladas de material, evitando a emissão de mais de 2 mil toneladas de CO2 (dióxido de carbono).

Ganhos ambientais
A lógica do ganho ambiental é simples. No momento em que produtos que estavam parados são colocados de volta no mercado, evita-se a extração de mais recursos naturais necessários para a fabricação de novos iguais ou similares.

A Federação Internacional da Indústria da Reciclagem – BIR (Bureau of International Recycling) calcula que a reciclagem de uma tonelada de aço economiza 1.100 kg de minério de ferro, 630 kg de carvão, 55 kg de calcário, 642 kWh de energia, 1,8 barris (287 litros) de petróleo e 2,3 metros cúbicos de aterro sanitário.

A fábrica de móveis gaúcha Florense é uma das que utilizam o serviço de OSucateiro.com. Anualmente, gera em média 400 toneladas de resíduos entre painéis de madeira, papel, papelão, plástico, espuma, fibra, entre outros, mas nenhum deles vai para aterro sanitário onde degradaria o solo.

Segundo a engenheira Débora Corso, gestora de qualidade e meio ambiente da Florense, a empresa encontrou na plataforma uma alternativa para o gerenciamento desses resíduos que ainda virariam sucata. “Através do OSucateiro.com já vendemos diversas matérias primas que saíram de linha e equipamentos que foram substituídos por outras tecnologias, mas que ainda funcionam e são úteis para outras empresas. Isso gera maior vida útil aos equipamentos reduzindo a sucata”, comemora.

OSucateiro.com é um dos 536 negócios brasileiros que figuram na lista do 3º Mapa de Negócios de Impacto Socioambiental, da think tank Pipe.Social. O mapa é um estudo, cuja primeira versão foi publicada em 2017 e que se repete a cada 2 anos, para acompanhar a evolução do pipeline de negócios de impacto positivo no país e referenciar o retrato atual do setor.

A terceira edição do Mapa foi realizada dentro de um cenário de extrema incerteza para a economia mundial e sob o impacto da pandemia. Ela mostra avanços importantes do ecossistema e quais são as oportunidades de aprimoramento. Apesar de uma parte importante da base mapeada de 1.300 negócios ainda não ser sustentável financeiramente, o levantamento revela que há mais soluções que deixaram a fase de ideação rumo ao modelo financeiramente sustentável.

Mesmo assim, a cada 10 negócios de impacto, 8 permanecem entre os estágios de desenvolvimento da solução até a organização do negócio – especialmente na busca por um modelo que gera sustentabilidade financeira.

O estudo também permitiu analisar o perfil sociodemográfico dos empreendedores à frente dos negócios socioambientais. Um dado importante é que, hoje, as mulheres estão presentes como fundadoras em 67% das empresas do setor (sendo que 23% das empresas mapeadas têm apenas mulheres à sua frente).

Do ponto de vista geográfico, o estado de São Paulo concentra o maior número de negócios de impacto socioambiental. O mapeamento mostrou que 58% desse tipo de negócio está na região Sudeste, 16% no Nordeste, 15% no Sul, 5% no Norte e outros 5% no Centro-Oeste.

O mapa do cenário de negócios que trilham o caminho do desenvolvimento sustentável no Brasil pode ser acessado no site da iniciativa: https://mapa2021.pipelabo.com/.

Este artigo foi escrito por Thaisa Pimpão e Alexandre Mansur. Publicado, originalmente, na coluna Ideias Renováveis, da Exame.

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