42 bilhões de dólares no caminho do aquecimento global

Esse é o valor que 91 empresas abertas da América Latina identificaram em oportunidades da economia regenerativa, no combate ao aquecimento global

Se os governos de alguns países recuaram em relação ao desafio das mudanças climáticas, pelo menos o setor privado parece ter acordado – e está agindo. Não é só pela consciência de que o aquecimento global é uma ameaça ao planeta como um todo, mas também porque as soluções para a crise climática têm o potencial de aumentar a competitividade. E este caminho já está sendo trilhado por grandes grupos empresariais da América Latina – que tem condição privilegiada para gerar energia limpa, fornecer alimentos com menor impacto e produzir serviços e produtos bons para o clima.

É isso o que mostram os dados do CDP, iniciativa criada há décadas pelos grandes fundos internacionais de investimento para catalisar o esforço privado pelo clima. Nas palavras de Lauro Marins, diretor executivo para a América Latina do CDP:

“Em 2018, 91 empresas de capital aberto, 895 fornecedores e 184 cidades da América Latina reportaram suas informações por meio do sistema de divulgação ambiental do CDP. Essas 91 empresas de capital aberto representam 90% do capital negociado em bolsa na região. Juntas, elas reportaram um valor 42 bilhões de dólares em oportunidades identificadas na área de clima. Essas empresas fizeram um investimento de 5 bilhões de dólares, que resultou na redução do equivalente a 921 milhões de toneladas de CO2.

Não foram só empresas que mostraram seus investimentos ao CDP. Também 184 cidades latino-americanas participantes reportaram conjuntamente ao CDP um total de 326 projetos climáticos que estão buscando mais de 5,6 bilhões de dólares de financiamento. Observa-se aí uma grande oportunidade para colaboração entre o setor público e privado por meio de estratégias já bem conhecidas, como PPPs, aliadas a novas abordagens como emissão de títulos verdes de projetos executados pela iniciativa privada em áreas-chave para a resiliência urbana.

O senso de urgência é o que move esses atores a agir já, uma vez que o quinto relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), lançado em outubro de 2018, deixou claro que temos apenas 12 anos para reduzir as emissões de gases de efeito estufa pela metade para evitar uma crise climática sem precedentes na história da humanidade.

Essa é a janela de tempo de que dispomos para converter a crise em oportunidade e botar de pé uma nova economia regenerativa, formada por soluções que contribuam para reverter as mudanças climáticas e ao mesmo tempo gerem prosperidade para as pessoas. A Universidade de Michigan estima que o mercado para produtos que capturam carbono da atmosfera, ajudando a reverter as mudanças climáticas, movimentará de 800 bilhões a 1,1 trilhão de dólares por ano até 2030. Esse novo mercado trará novas oportunidades de negócios e atuação profissional. Aqueles que primeiro reagirem a esses sinais colherão os frutos do seu pioneirismo, posicionando-se na liderança dessa nova e próspera economia.

É crescente o coro formado pela comunidade de negócios e governos subnacionais de que a mudança climática é o principal vetor de riscos e oportunidades para a economia e para a sociedade.

Começamos a ver na América Latina um movimento similar ao que ocorreu nos Estados Unidos após a eleição de Donald Trump, em que, diante dos retrocessos vindos da Casa Branca em relação a políticas climáticas, a comunidade de negócios, governos subnacionais e sociedade civil se reuniram em torno de uma coalizão chamada We are still in (nós ainda estamos dentro). Esses atores levantaram as suas vozes em apoio ao Acordo de Paris, se comprometendo a ajudar a alcançar os objetivos climáticos nele traçados.

Um episódio recente no Brasil dá sinais de que esse contraponto também começa a ganhar corpo no país. Depois de retirar a sua candidatura como sede da Convenção do Clima, o governo federal também tentou intervir na decisão da cidade de Salvador de sediar a conferência Climate Week, evento tradicional no calendário de discussões internacionais sobre clima. Apesar disso, o prefeito Antonio Carlos Magalhães Neto se colocou à disposição da organização da Climate Week para realizar a conferência na capital baiana. Diante da pressão da sociedade civil, governos subnacionais e empresas, o governo federal retrocedeu e decidiu apoiar a realização da Climate Week. Experiências como essa levam especialistas a afirmar que os governos subnacionais e os negócios terão papel protagonista para manutenção e implementação das políticas climáticas no país.”

Uma amostra dessa discussão acontecerá nos dias 11 e 12 de junho, em São Paulo, na primeira feira de negócios pelo clima da América Latina, uma realização do CDP, O Mundo Que Queremos e WWF-Brasil, com apoio de EXAME. O evento reunirá mais de 300 pessoas, incluindo prefeitos, CEOs de grandes empresas, fundadores de start-ups de negócios pelo clima, lideranças jovens e financiadores. Ao longo dos dois dias de evento, eles debaterão soluções tecnológicas, modelos de negócios inovadores e também exemplos de ações coletivas e coordenadas entre setor privado, público e a sociedade civil para acelerar uma nova economia regenerativa capaz de reverter as mudanças climáticas e gerar prosperidade.

A feira trará ainda uma missão comercial patrocinada pelo Governo do Canadá e uma comitiva de 15 cidades e start-ups latino-americanas, financiada pela Fundação Konrad Adenauer. Esses grupos participarão de rodadas de negócios que vão reunir mais de 200 participantes, entre representantes de prefeituras, grandes corporações, start-ups e instituições financeiras – com a missão de consolidar a posição da América Latina como um lugar privilegiado para fazer brotar iniciativas boas para o clima.

Este artigo foi escrito por Alexandre Mansur e originalmente publicado na coluna Ideias Renováveis da revista Exame.

Foto: Planeta Terra: o setor privado tem se movimentado para combater o aquecimento global (./Thinkstock)

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