Com desmatamento em alta, uma busca pela carne inocente

A maior parte do desmatamento na Amazônia envolve a pecuária e ninguém consegue garantir a legalidade da cadeia de fornecedores

As queimadas e o desmatamento na Amazônia horrorizam o Brasil e o mundo. No dia 18 de novembro o governo anunciou os dados alarmantes do sistema de monitoramento do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. Eles registram o maior crescimento na taxa anual de desmatamento dos últimos 22 anos. A floresta perdeu quase 10 mil quilômetros quadrados entre agosto de 2018 e julho de 2019. Além de criminoso, esse desmatamento é um risco para cada um de nós. Afinal, a Amazônia é uma garantia de estabilidade do clima no mundo. Por isso, o que acontece por lá interessa à sobrevivência da nossa civilização. No ano que vem, com a chegada da próxima estação de seca, a partir de junho, a Amazônia vai arder de novo. O desmatamento pode ter um novo pico, talvez maior ainda pela ausência de medidas para conter a devastação e pela presença de incentivos às atividades predatórias.

O que isso tem a ver com a nossa carne? Tudo. Cerca de 40% do gado brasileiro está na Amazônia. Cerca de 90% do desmatamento serve para abrir pastagens. Parte delas são abertas em terras privadas, quase sempre sem autorização legal. A outra parte das pastagens são abertas em florestas públicas invadidas por quadrilhas de especuladores de terras. Os grileiros usam a pecuária para ocupar terras públicas invadidas e destruídas e a criação de gado está associada a trabalho escravo e ao aquecimento global. Isso tudo assusta os investidores. O documentário Sob a Pata do Boi, de Marcio Isensee e Sá, conta isso em detalhes. Essas revelações deixam os consumidores com pé atrás antes de escolher a picanha de uma marca ou outra no supermercado.

Num ambiente dominado pela ilegalidade, resta ao produtor provar que não está ligado às irregularidades. É claro que pela lei existe a presunção de inocência. Mas no âmbito da comunicação e do marketing não é assim. Na percepção pública, você precisa na prática se provar inocente se atua numa região e num mercado dominados pelo crime.

A imagem do setor da pecuária ficou seriamente comprometida com uma série de denúncias de ilegalidades. Em 2017, a operação da Polícia Federal “A Carne é Fraca”, que investigou empresas acusadas de vender carne adulterada, ganhou os noticiários e lançou dúvidas na comunidade internacional sobre o futuro da indústria da carne no Brasil. Na mesma época, o Greenpeace também publicou um relatório em que percorreu a cadeia de produção e fez o elo entre pecuária criminosa e o supermercado. Desde então, o assunto não saiu da mira da imprensa e da preocupação dos investidores. No último mês, por pressões de ONGs e do setor financeiro, o Carrefour pediu informações aos frigoríficos sobre o desmatamento da Amazônia, o que sinaliza que os supermercados também devem começar a fazer cobranças nesse sentido.

Mas essa discussão começou muito antes. No Pará, o maior produtor de carne da região Norte do país, os acordos pela regularização começaram há quase dez anos, quando o Ministério Público Federal denunciou que a criação de gado no Estado causava sérios danos ambientais à Amazônia. As irregularidades reveladas eram tão graves que, na época, dezenas de redes de supermercados suspenderam a compra de produtos bovinos da região, o que provocou a paralisação de grandes abatedouros. Diante disso, em negociação com o Ministério Público Federal (MPF), cerca de 100 frigoríficos, empresas calçadistas e outras que trabalham com produtos cuja matéria-prima vem da pecuária assinaram Termos de Ajustamento de Conduta (TACs) se comprometendo a fazer uma série de exigências ambientais e sociais aos seus fornecedores.

Os acordos são acompanhados de perto pelo MPF e, entre as exigências previstas, está a de que todas as propriedades rurais que pretendam negociar no mercado da pecuária não sejam flagradas nem processadas por desmatamento ilegal. Na última semana (12/11), o MPF divulgou o resultado da segunda leva de auditorias dos acordos. Os frigoríficos avançaram no cumprimento da legislação ambiental, mas isso ainda não é suficiente. Durante o anúncio dos dados o procurador Daniel Azeredo, um dos responsáveis pelos casos, afirmou que nenhuma empresa que compra da Amazônia pode dizer que não tem gado vindo de desmatamento em sua cadeia produtiva

Há uma lacuna importante no sistema de monitoramento. Para entender isso, é preciso entender como é a cadeia de produção da carne. O bezerro geralmente nasce numa fazenda, cresce em outra, engorda em outra e só aí é vendido para o abatedouro. Os abatedouros (ou frigoríficos), no entanto, têm como hábito conferir a conformidade fundiária e ambiental só da fazenda que vende direto para eles. As outras fazendas fornecedoras terceirizadas não estão sendo monitoradas. E é lá que estão as atividades ilegais.

A Global Witness, ONG internacional que há anos investiga o desmatamento pelo mundo e esteve em Belém quando os dados foram divulgados, vê com bons olhos os esforços do MPF no monitoramento da situação, mas ressalta que é fundamental que os frigoríficos façam mais para libertar suas cadeias de fornecimento de desmatamento e que seus financiadores internacionais também tomem medidas imediatas. Para Mariana Abreu, investigadora da Global Witness, essas empresas estão ansiosas para dizer como essas auditorias destacam seus bons desempenhos – mas as novas estatísticas contam apenas parte da história quando se trata da destruição da Amazônia, já que nem olham para as partes mais vulneráveis da cadeia de suprimentos, como os fornecedores indiretos.

“As instituições permitem que o dinheiro seja injetado em empresas como JBS e Minerva”, diz Mariana Abreu. “Essas empresas devem assumir a responsabilidade e os governos internacionais devem responsabilizá-las pedindo uma regulamentação mais forte, com as devidas diligências. Isso é fundamental se quisermos parar a destruição acelerada da Amazônia brasileira, nosso clima e danos às comunidades que vivem e dependem desta floresta crucial.” Tudo isso gera uma tremenda suspeição sobre a carne brasileira.

Mas existem iniciativas para produzir carne na Amazônia de forma correta. Caio Penido é coordenador do grupo de trabalho da pecuária sustentável, uma organização de pecuaristas que defende medidas razoáveis para ter uma pecuária decente. Segundo ele é imprescindível que todos respeitem o Código Florestal e as regras de desmatamento legal, de acordo com a região da fazenda. “O desafio agora é encontrar outra forma de conservar toda essa biodiversidade, substituir a estratégia de conservar por ‘moratórias’ e criar mecanismos de valorização da floresta viva, como pagamento por serviços ambientais, créditos de carbono e ecoturismo”, diz.

O Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora) tem trabalhado com iniciativas regionais já estabelecidas e que promovam sistemas de produção mais sustentáveis, conciliando produção e conservação. O Programa Novo Campo, acompanhado pela ONG, é um bom exemplo. A iniciativa atua em fazendas de pecuária de corte no estado do Mato Grosso e fomenta práticas de intensificação sustentável da pecuária, por meio da adição de boas práticas e recuperação de áreas de pastagem degradadas. Além de não desmatar e reduzir e a emissão de gases do efeito estufa, a expectativa é que as fazendas participantes consigam aumentar em até cinco vezes a quantidade de carne produzida.

É claro que dá para criar bois com tudo correto na Amazônia. Quem ainda tem dúvidas pode perguntar para o pessoal da Pecuária Sustentável da Amazônia (Pecsa), empresa que gerencia as fazendas, com boas práticas ambientais e bom manejo do gado. O trabalho deles começou quando um grupo de pesquisadores percebeu, durante um estudo, que cuidar melhor do gado e da floresta permitia aumentar a receita da atividade. Eles então conseguiram captar 11,5 milhões de euros de um fundo de investimento de impacto e com esse dinheiro criaram a Pecsa para investir em recuperação das fazendas de pecuária. Funciona assim: a empresa assume a gestão da fazenda por um período de seis a sete anos e, ao final desse período, devolve a fazenda ao proprietário com todas as benfeitorias e as novas técnicas de gestão.

No tempo em que a Pecsa fica na gestão da fazenda, investe pesado em melhorias: cerca e reforma a área de pastagem, separando-a da reserva legal e das áreas de proteção permanente, e constrói um sistema de captação e estocagem de água e bebedouros em pasto, ajudando a recuperar a mata das margens dos rios e nascentes. Além disso, a empresa faz o replantio da vegetação nas áreas de preservação permanente danificadas e da reserva legal devida (na Amazônia, é preciso conservar floresta em 80% de cada propriedade). O custo é alto, mas eles garantem que os resultados compensam: a capacidade da fazenda aumenta porque ela passa a produzir mais sem expandir a área ocupada e a produtividade também cresce porque os bois amadurecem mais rápido para o abate, graças à rotação do pasto, o suplemento alimentar e os cuidados de higiene. Com tudo isso as finanças também ganham e o grupo garante que a margem de lucro nas fazendas que adotam as melhores práticas costuma experimentar um crescimento considerável.

Se existe uma desconfiança crescente da pecuária, se está claro que o sistema atual de verificação é falho, e se é possível produzir corretamente, o que falta agora é um processo realmente completo e confiável para monitorar toda a cadeia. Quem conseguir montar esse sistema finalmente irá permitir que se compre carne livre de desmatamento.

Para Paulo Barreto, pesquisador sênior do Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), o ideal é implantar um sistema de rastreamento do gado desde o nascimento. Ele lembra que já existe tecnologia pra isso. Bastaria, por exemplo, adaptar o sistema que já é utilizado para controle de doenças na carne exportada para a Europa. “Falta uma liderança, um ‘lobby do bem’, para fazer isso acontecer”, observa. Um frigorífico sozinho não consegue resolver mas, para Paulo, se os grandes grupos se juntarem e pressionarem o governo, existem várias ferramentas para fazer isso e exemplos que dão certo no mundo todo, como os títulos verdes. “Enquanto o mercado continuar comprando carne de origem ilegal, a coisa não vai andar. O setor financeiro também poderia pressionar mais. Eles sabem do problema, mas ninguém está dando o empurrão para sair dessa inércia.”

Um sistema que finalmente separe os produtores regulares dos que agem criminosamente no campo das fazendas terceirizadas terá o potencial para atacar o principal vetor de desmatamento e violência na Amazônia. Também dará segurança para consumidores, investidores e empresas decentes na cadeia da carne. Quem conseguir montar um sistema como esse primeiro vai ganhar mais, vendendo carne gostosa e sem culpa.

Este artigo foi originalmente escrito por Angélica Queiroz e Alexandre Mansur e publicado na coluna Ideias Renováveis da revista Exame.

Foto: Cena do documentário “Sob a pata do boi”: a pecuária destrói a floresta (Foto/Divulgação)

Prêmio Melhores ONGs homenageia quem trabalha para melhorar o Brasil

O Mundo Que Queremos, o Instituto Doar e a Rede Filantropia apresentam os vencedores dos maior prêmio do Terceiro Setor

 

O Mundo Que Queremos, o Instituto Doar e a Rede Filantropia apresentaram no dia 18 de novembro os vencedores do prêmio Melhores ONGs. A iniciativa revelou pelo terceiro ano seguido as organizações com melhor gestão e eficiência nas mais diversas causas.  A cerimônia de entrega lotou (até o mezzanino) o Teatro J Safra em São Paulo.

Os resultados saíram em primeira mão nesta reportagem da revista Época Negócios.

As 100 ONGs vencedoras, e os destaques especiais por área de atuação e por região do país, são escolhidos depois de um processo de avaliação que começa com a inscrição de milhares de concorrentes.  Por suas dimensões e pelo reconhecimento, o Melhores ONGs é o maior prêmio do Terceiro Setor brasileiro.

“O prêmio é um reconhecimento às pessoas e às organizações que trabalham para melhorar a sociedade brasileira”, afirma Alexandre Mansur, diretor de projetos do Mundo Que Queremos. ” A diversidade de causas e iniciativas representada no universo das 100 Melhores ONGs do Brasil também mostra o vigor de nosso Terceiro Setor. As ONGs são uma expressão da liberdade democrática e do espírito cívico do brasileiro. É através delas que pessoas generosas se reúnem para ajudar a melhorar o país. Cada um da sua forma, fazendo sua parte para atuar em áreas onde o poder público ou as empresas não alcançam.”

>> O artigo da revista Exame analisa quem sustenta as ONGs?

“Prêmio Melhores ONGs” avalia entidades inscritas, por meio de pesquisadores da FGV, e ranqueia aquelas que melhor atendem critérios de avaliação, como a estrutura administrativa e financeira, se a entidade possui conselhos de gestão, se faz auditorias independentes, se há plano de captação de recursos, além da prestação de contas e da transparência na gestão de recursos”, diz Marcelo Estraviz, presidente do Instituto Doar.

Confira abaixo outras ONGs premiadas por categoria especial.

>>Aqui a reportagem da Época Negócios com os resultados de 2018.

Melhor ONG – Região Norte: Fundação Amazonas Sustentável

A Fundação Amazonas Sustentável (FAS) é uma organização brasileira não governamental, sem fins lucrativos, criada em 8 de fevereiro de 2008, pelo Banco Bradesco em parceria com o Governo do Estado do Amazonas. Posteriormente, passou a contar com o apoio da Coca-Cola Brasil (2009), do Fundo Amazônia (2010) e da Samsung (2010), além de outras parcerias em programas e projetos desenvolvidos. As principais iniciativas são implementadas por meio do Programa Bolsa Floresta (PBF), Programa de Educação e Saúde (PES), Programa de Soluções Inovadoras (PSI) e Programa de Gestão e Transparência (PGT). Em 2016, a FAS assistiu 9.597 famílias, beneficiando 40.230 pessoas moradoras de 16 Unidades de Conservação (UC) do Amazonas.

Melhor ONG – Região Nordeste: Centro Cidadania

O Centro Cidadania – Ação e Educação Socioambiental surgiu em 2003 a partir da constante comunhão de um grupo de pessoas com objetivos de melhorar as condições de vida da população residente na microrregião da Serra do Teixeira, uma área que aglutina 07 municípios do semiárido paraibano. Com uma proposta de atuar nas áreas sociais e ambientais, desenvolveram várias atividades e estabeleceram parcerias com entidades de caráter governamental e comunitário. Nos últimos anos, com o agravamento da situação social na nossa área de atuação, vimos levantando dados mais completos sobre a nossa realidade através da confecção de um diagnóstico socioambiental para que possamos ser mais assertivos em nossa jornada.

Melhor ONG – Região Centro-Oeste: Hospital do Câncer de Rio Verde

A Fundação Cristã Angélica- Hospital do Câncer de Rio Verde, fundada em 17 de fevereiro de 1991, constitui-se e possui caráter de Sociedade Civil de Direito Privado, com Personalidade Jurídica, sem fins lucrativos, declarada e reconhecida como Entidade Filantrópica nas três esferas, Municipal, Estadual e Federal, com 93% dos atendimentos realizados pelo SUS vem. Através dos anos vem ampliando os atendimentos, hoje é uma instituição que realiza a prevenção e o diagnostico do câncer em Rio Verde e a Regional sudoeste I com mais de 700 mil habitantes e dezoito municípios.

Melhor ONG – Região do Sudeste: Pró-Saber SP/ AMPARA Animal / Vocação

Pró-Saber SP

O Instituto Pró-Saber SP é uma organização da sociedade civil sem fins lucrativos que atua na comunidade de Paraisópolis, em São Paulo. O Instituto tem como missão diminuir a desigualdade por meio da garantia do Direito de toda criança Ler & Brincar. Criado em 2003, o Pró-Saber SP derivou da experiência da sede carioca homônima fundada em 1987, cuja missão é encontrar, trabalhar e difundir alternativas teóricas e práticas para responder aos desafios educacionais brasileiros.

AMPARA Animal

Em atividade desde 2010, A AMPARA Animal nasceu quando as fundadoras Juliana Camargo e Marcele Becker se uniram por amor e respeito aos animais. Juntas sonharam em criar um projeto para mudar a realidade dos animais rejeitados e abandonados do Brasil.

Em 9 anos

Mais de 1,6 milhão de quilos de ração distribuídos

Mais de 155 mil vacinas

Mais de 350 mil animais medicados

Mais de 4.600 animais castrados

Mais de 12.000 animais adotados

Vocação

A Vocação, antiga Ação Comunitária do Brasil, foi fundada pelos empresários Francisco Matarazzo Sobrinho, Paulo Ayres Filho, Ruy Mesquita e José Martins Pinheiro Neto na década de 60, quando projetos sociais arrojados não existiam no país. Nos anos 70, estabeleceu convênios com organizações de bairros e investiu na criação de metodologias pedagógicas. Nas décadas seguintes, passou a oferecer atendimento completo e integrado com práticas de Educação, Saúde e Cultura. Na virada do Século, dedicou-se ao atendimento prioritário à criança, ao adolescente e ao jovem com foco nas ações socioeducativas, inserção no mercado de trabalho e desenvolvimento comunitário, e aproximou-se do governo para influir em políticas públicas

Melhor ONG – Região do Sul: ASSOCIAÇÃO PARANAENSE DE APOIO A CRIANÇA COM NEOPLASIA

Fundada no dia 21 de outubro de 1983, a APACN foi a primeira instituição a amparar crianças e adolescentes com câncer no Brasil. A história começou pela união e dedicação de um grupo de casais, pais de crianças com algum tipo de câncer que se sensibilizaram diante da situação de famílias desprovidas de condições financeiras que, enfrentando a mesma doença, chegavam à cidade, sem moradia/hospedagem ou mesmo um meio de locomoção. Dessa forma solidários, formaram um grupo que prontamente providenciou um local destinado a acolher dignamente essas famílias, do início até o final do tratamento.

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Melhor ONG – Assistência Social: Asas de Socorro

Harold e Elsie Berk chegaram ao Brasil em 1955. Estudaram o nosso idioma e em seguida, mudaram-se para Anápolis – GO, para implantar o primeiro centro de revisão de aeronaves, com foco no trabalho missionário no Norte do país. Após atuar por quatro anos no México como piloto missionário, voando pela missão: MAF (Mission Aviation Fellowship), missão de onde nasceria posteriormente a atual Asas de Socorro.

Melhor ONG – Criança e Adolescente: ChildFund Brasil

A história começou lá na China com o americano Calvitt Clarke e sua esposa Helen, um casal presbiteriano (denominação protestante baseada no Calvinismo). Munidos de recursos enviados por amigos norte-americanos, eles estavam em uma missão para amparar crianças órfãs, vítimas da guerra entre o Japão e a China. Em 1938, Calvitt e Helen foram para a China e criaram o China Children’s Fund (CCF). A iniciativa deu tão certo e colheu tantos frutos positivos que eles decidiram expandir a organização para vários outros países. Com essa expansão, o nome da organização mudou e ficou mundialmente conhecido como Christian Children’s Fund. Como nosso país é o coração da América do Sul e tem uma posição estratégica na América Latina, por isso, em 1966, foi inaugurado o primeiro escritório regional do CCF aqui. Com sede localizada em Belo Horizonte (MG), a agência de desenvolvimento infantil atenderia crianças e adolescentes em situação de risco social na Argentina, na Bolívia, no Brasil, no Chile, na Colômbia, no Equador, no Paraguai, no Peru e no Uruguai.

Melhor ONG – Cultura: Santa Marcelina Cultura

Em dezembro de 2007 a Associação Santa Marcelina – responsável pela Fasm e pelo Colégio Santa Marcelina, ambos no bairro de Perdizes – foi qualificada pelo Governo do Estado como Organização Social de Cultura, apta a gerir programas em parceria com a Secretaria da Cultura. Em 2008 a Associação começou a implementar o seu primeiro programa na área da cultura, batizado pelo Governo como Guri Santa Marcelina, com o intuito de valorizar a marca do Guri associando-a à tradição de excelência da Santa Marcelina. Em 2009, a Santa Marcelina Cultura inaugurou a inovadora proposta da EMESP Tom Jobim e do Festival de Inverno de Campos do Jordão, ambos estruturados sob as mesmas diretrizes artístico-pedagógicas: integração entre os aspectos artístico, pedagógico e social; abrangência estética de toda a história da música, desde a música antiga à contemporânea; excelência artístico-pedagógica; intercâmbio internacional para confrontação constante com as melhores práticas e abertura de oportunidades para o aluno continuar seus estudos no exterior; e foco nas pessoas: o professor, o aluno e o público são a prioridade em todas as atividades.

Melhor ONG – Desenvolvimento Local: ESF-Brasil

Com a missão de ajudar os núcleos dos Engenheiros Sem Fronteiras Brasil a desenvolver seu máximo potencial de impacto nas comunidades. Fazem isso oferecendo constantemente suporte qualificado de gestão e técnico aos núcleos, gerenciamento da rede ESF e representatividade interna e externa. Possibilitando dessa forma que os núcleos foquem cada vez mais em fazer mais projetos de qualidade nas comunidades onde estão inseridos.

Melhor ONG – Direitos Humanos: Instituto Sou da Paz

O Sou da Paz começou como uma campanha pelo desarmamento, lançada em 1997 por um grupo de estudantes para jogar luz sobre um tema até então desconsiderado no debate sobre segurança pública. Um estudo da ONU realizado em 1996 apontava o Brasil como o país onde mais se matava por armas de fogo em todo o mundo. Os primeiros projetos voltaram-se às regiões e públicos mais afetados pelos homicídios: os jovens moradores dos distritos do Jardim Ângela, Jardim São Luis e Capão Redondo, zona sul da capital paulista. Iniciativas de valorização da convivência e participação e formação de empreendedores impactaram nas histórias de vida de diversos grupos. Gradualmente o Sou da Paz ampliou os temas de trabalho: desde 2003 realiza projetos para melhorar a atuação das polícias; nos anos seguintes prestou assessoria a diversas prefeituras na realização de diagnósticos e planos locais de prevenção da violência; em seguida passou a atuar em rede.

Melhor ONG – Educação: CEAP

Em 1985, um grupo de universitários que frequentavam a politécnica da USP (Universidade de São Paulo), foram para o extremo sul de São Paulo, no bairro de Pedreira, região com um dos piores Índices de Desenvolvimento Humano da cidade de São Paulo, conforme constatado em pesquisa. Na Pedreira, bairro com alto índice de criminalidade, analfabetismo, com pouco saneamento básico e acesso a recursos limitados, ali, onde inicialmente era um aterro clandestino, e que foi cedido pela prefeitura, nascia o que no futuro seria chamado de CEAP. Alinhado ao mercado que mais crescia e a carecia de mão de obra na época, ao interesse dos moradores locais e a necessidade de se democratizar o acesso a tecnologia, o primeiro curso desenvolvido na organização, composta então apenas por uma construção rústica de madeira, com uma única sala de aula e escritório administrativo, foi o curso Rádio e Televisão com uma turma de oito alunos.

Melhor ONG – Meio Ambiente: Associação Ambientalista Copaíba / Organização de Conservação de Terras do Baixo Sul da Bahia – OCT

Associação Ambientalista Copaíba

A Copaíba foi fundada em 1999 por um grupo de amigos que, percebendo a degradação da Mata Atlântica no município de Socorro-SP, resolveu agir e trabalhar com a restauração de matas ciliares, inicialmente, do Rio do Peixe. A primeira ação do grupo foi modesta: um plantio de 80 mudas em uma área às margens do Rio do Peixe em Socorro. A mão de obra ficou sob a responsabilidade de voluntários. A ideia de restaurar a Mata Atlântica na região ganhou a adesão de novos voluntários e de outras organizações. Com o tempo, o trabalho da ONG ganhou corpo e desenvolveu membros a partir de diversas ações integradas na área ambiental, de projetos e programas de restauração florestal à produção de mudas nativas, iniciativas de sensibilização à participação em políticas públicas em meio ambiente.

Organização de Conservação de Terras do Baixo Sul da Bahia – OCT

Organização da Sociedade Civil, fundada em 2001, a Organização de Conservação da Terra (OCT) atua no Baixo Sul da Bahia. Trabalha no planejamento da paisagem, visando ser propositiva em um modelo de desenvolvimento que possa gerar sustentabilidade. A instituição acumula um portfólio de experiências e conhecimentos na geração e valoração dos serviços e ativos ambientais, consolidando desenvolvimento e crescimento em bases sustentáveis. Com a linha de atuação em Conservação Ambiental, executa serviços ambientais e de fortalecimento dos recursos naturais. Nesse contexto, coordena projetos que restauram e recuperam nascentes, favorecendo a capacidade hídrica da região e a compensação de carbono. Além disso, contribui para a regularização ambiental de propriedades, ajudando agricultores a efetuarem o Cadastro Estadual Florestal de Imóveis Rurais (Cefir).

Melhor ONG – Meio Ambiente: Organização de Conservação de Terras do Baixo Sul da Bahia

Organização da Sociedade Civil, fundada em 2001, a Organização de Conservação da Terra (OCT) atua no Baixo Sul da Bahia. Trabalha no planejamento da paisagem, visando ser propositiva em um modelo de desenvolvimento que possa gerar sustentabilidade. A instituição acumula um portfólio de experiências e conhecimentos na geração e valoração dos serviços e ativos ambientais, consolidando desenvolvimento e crescimento em bases sustentáveis. Com a linha de atuação em Conservação Ambiental, executa serviços ambientais e de fortalecimento dos recursos naturais. Nesse contexto, coordena projetos que restauram e recuperam nascentes, favorecendo a capacidade hídrica da região e a compensação de carbono. Além disso, contribui para a regularização ambiental de propriedades, ajudando agricultores a efetuarem o Cadastro Estadual Florestal de Imóveis Rurais (Cefir).

Melhor ONG – Saúde: Grupo Luta Pela Vida / Hospital do Câncer em Uberlândia

Grupo Luta Pela Vida

O Grupo Luta Pela Vida é uma instituição sem fins lucrativos fundada em 1996 por um grupo de pessoas que tem como objetivo oferecer bem-estar e melhores condições de tratamento e cura aos pacientes oncológicos atendidos em Uberlândia. Desde a sua fundação, tem trabalhado junto à comunidade e empresas a fim de obter recursos financeiros em prol da construção, manutenção e ampliação do Hospital do Câncer em Uberlândia. O Grupo realiza também investimentos em novas tecnologias, pesquisa e prevenção do câncer, visando sempre oferecer um tratamento de ponta e qualidade. Além dos recursos voltados para infraestrutura e atendimento, oferece também aos pacientes e seus familiares apoio psicossocial e material. A filosofia de realizar um atendimento humanizado na luta contra a doença é aplicada principalmente por meio das ações realizadas pelo Núcleo de Voluntários, que conta atualmente com 500 voluntários.

Hospital do Câncer em Uberlândia

O Hospital do Câncer em Uberlândia é um centro de referência para o tratamento do câncer no interior de Minas Gerais, que oferece atendimento totalmente gratuito e de qualidade aos pacientes da cidade e região. É construído e equipado pelo Grupo Luta pela Vida, ONG criada para oferecer as melhores condições de tratamento aos pacientes com câncer. O Hospital do Câncer atende atualmente cerca de 8.500 pacientes, vindos de mais de 80 cidades da região.

Melhor ONG – Pequeno Porte: Unidos pela Vida – Instituto Brasileiro de Atenção à Fibrose Cística

A história começou em Agosto de 2009, quando a fundadora, teve um sonho durante uma das noites no hospital, onde estava internada para tratar uma grave pneumonia. Era mais um internamento, dentre tantos outros inúmeros que havia tido durante os seus primeiros 23 anos de vida. Assim, em 2011 fundou o Unidos pela Vida – Instituto Brasileiro de Atenção à Fibrose Cística, com sede em Curitiba, tem como missão fortalecer e desenvolver o ecossistema da fibrose cística por meio de ações que impactem na melhora da qualidade de vida dos pacientes, familiares e demais envolvidos.

Foto: Vencedores do Melhores ONGs no final da premiação (crédito Alexandre Mansur)

Por que as empresas não recebem os fiscais ambientais com flores?

Fiscais do IBAMA fazem operação contra agrotóxicos ilegais na Bahia

É menos estranho do que parece. Em vez de encarar a fiscalização como um obstáculo à produtividade, pode-se enxergá-la como um serviço gratuito de mapeamento de riscos

O Brasil tem uma legislação ambiental bastante abrangente. Para alguns ufanistas, é a lei mais avançada do mundo; para alguns críticos, é a mais rigorosa. Como explicar então que esse poderoso arcabouço legal não consiga melhores resultados em barrar a devastação do cerrado ou da floresta Amazônica? Ou, mais premente, impedir tragédias como a de Mariana ou Brumadinho?

Uma parcela da resposta está na forma como boa parte das empresas lida com a fiscalização. Embora as companhias mais bem estruturadas tenham setores de sustentabilidade, compliance, responsabilidade corporativa ou o nome que você preferir, a principal interação delas com o órgão fiscalizador se dá na área da contestação jurídica. Isso quando não ocorre alguma negociação com instâncias políticas superiores para reverter ou aliviar determinada autuação.

A judicialização do relacionamento com os órgãos ambientais têm razões estruturais. Existem procedimentos preestabelecidos dentro das empresas para lidar com uma notificação ou autuação ambiental recebida. Normalmente, várias áreas são informadas, mas, de fato, frequentemente, o departamento jurídico lidera a decisão sobre como a autuação será respondida e o que precisa ser feito – e ele olha para a notificação do ponto de vista legal. “Não há nada de errado nisso. Cada área deve dizer, diante de um evento como esse, o que, considerando suas responsabilidades, deve ser feito”, afirma Nelmara Arbex, fundadora da Arbex & Company, empresa de consultoria internacional em gestão de negócios e sustentabilidade. “Porém, o que está sendo discutido no momento é se a resposta jurídica é considerada a mais importante a ser dada, ou mesmo a única. Isso significaria que as razões da autuação, ou a análise sobre a que aspectos da operação ela está ligada, ou a que riscos, se avaliações mais profundas devem ser feitas, ficam em segundo plano. E acabam, aparentemente, sendo deixadas de lado”, diz.

A razão para esse tipo de procedimento virar rotina, o jeito normal de proceder, tem a ver, entre outros fatores, com um entendimento sobre onde deve estar o foco dos executivos que tomam as grandes decisões das empresas. “Normalmente o foco deles está na estratégia, em como fazer negócios financeiramente bem-sucedidos”, afirma Nelmara. O problema dos tempos atuais é que fazer negócios financeiramente bem-sucedidos tem cada vez mais a ver com questões éticas, reputacionais, impactos socioambientais, transparência. “São temas que não fazem parte do radar cotidiano dos principais tomadores de decisões”, diz. Eles precisam ter isso em mente, ou se rodear de pessoas que tenham. Executivos precisam cuidar do capital intangível, que hoje representa a maior parte do valor das empresas no mercado.

Num universo paralelo, os fiscais seriam recebidos com flores, e não com advogados, pelas empresas. Já pensou? Hoje soa mais irreal do que duendes e fadas na linha de produção. Se você recebeu uma notificação de irregularidade por parte de algum órgão ambiental, aceite-a com carinho. Se recebeu uma multa, agradeça. Cumprimente o fiscal e seja grato ao presente que ele está lhe dando. A direção da empresa devia agradecer as autuações, as multas, as condicionantes. É um serviço de mapeamento de risco gratuito oferecido pelo órgão público. Prestar atenção a ele ajuda a evitar problemas infinitamente maiores.

A mensagem do coelhinho da Páscoa aqui é que a autuação ambiental tem como função enviar uma mensagem para a empresa de que há algo a ser melhorado, algo que apresenta riscos. E que ela precisa parar para entender o que precisa ser feito no curto e no longo prazo, não somente legalmente, mas em vários aspectos da operação.

O que precisa mudar na organização interna da empresa para ela aproveitar esses sinais de alerta em seu benefício e em benefício da comunidade na qual ela opera? Um caminho seria desenhar e implementar procedimentos que garantam que as notificações e autuações sejam dirigidas a um fórum interno composto por várias áreas. Inclusive o jurídico, mas não somente. E que nesse fórum se discuta quais são os riscos em torno da notificação/autuação e quais as recomendações para os executivos e o conselho. Isso facilitaria a discussão fora dos silos empresariais e o compartilhamento de várias perspectivas com os tomadores de decisão.

Isso depende, é claro, do apetite da empresa para realmente se preparar para o futuro. Existem empresas que vão além dos requisitos legais. “Elas procuram identificar em seus processos e relacionamentos, de forma correta e ética, riscos e oportunidades, e com base nessa análise, traçar estratégias e planos de atuação que as diferenciem dos concorrentes, possibilitando novos mercados, fidelidade dos clientes e respeito da sociedade”, afirma David Canassa, diretor das reservas do Grupo Votorantim. “Essas empresas estão pensando em sustentabilidade, talvez sem utilizar o termo.”

O que complica a construção de uma boa relação de confiança entre os órgãos ambientais e as empresas é um capricho legal do Brasil. Os técnicos dos órgãos do governo respondem na pessoa física, caso exista algum “erro” na sua análise. Isso torna tudo mais explosivo. O sujeito entra no órgão ambiental, cai na mão dele um processo de licenciamento e, para se precaver, ele começa a pedir um monte de estudos, informações, que podem protelar a licença. Afinal, se algo sair errado, ele vai pagar tudo sozinho. A postura da atual administração federal de tentar criminalizar a fiscalização também não ajuda. Até o desastre em Brumadinho, o discurso oficial do presidente e do ministro do Meio Ambiente era que o Brasil tinha excesso de fiscalização. O ministro, condenado por improbidade administrativa por tentar facilitar licenças de mineradoras na bacia do rio Tietê em São Paulo, defendia flexibilidade com a aplicação da lei ambiental.

Um caso real ocorrido recentemente nos Estados Unidos ajuda a ilustrar como pode funcionar um ambiente de parceria entre o órgão fiscalizador e o setor produtivo. Ocorreu com uma mineradora. A equipe estava trabalhando na mina quando apareceu um fiscal caminhando, sem aviso prévio. Ele procurou o encarregado, fez algumas perguntas e deu uma notificação para ele sobre um processo produtivo. Disse o seguinte: na próxima semana volto para inspecionar. Tal como disse, na próxima semana ele apareceu da mesma maneira, pediu que lhe mostrassem os esclarecimentos. Sentiu-se satisfeito e solicitou a cópia da notificação que ele mesmo tinha lavrado. Imediatamente ele a anulou e foi embora. A operação ficou mais segura, sem burocracia e atrito desnecessário.

Este artigo foi originalmente publicado na coluna Ideias Renováveis da revista Exame.

Foto: Fiscais do IBAMA fazem operação contra agrotóxicos ilegais na Bahia (Vinícius Mendonça/Ibama)

O Brasil pode ser o herói do clima

Uma boa reputação ambiental não é apenas uma questão política. Ela é crucial para quem faz negócios

 

Agricultura brasileira está diante de uma encruzilhada. De um lado, pode se consolidar como a grande vilã do mundo, uma destruidora das florestas do Brasil e do equilíbrio climático de todo o planeta. De outro lado, pode ser vista como a grande salvadora da biodiversidade da floresta e mantenedora do aquecimento global em níveis administráveis. A decisão sobre o caminho a seguir será tomada nos próximos meses.

É patente que a imagem do Brasil no exterior vem se deteriorando aceleradamente desde o início do governo Bolsonaro. Sem entrar nos méritos dos motivos, a política ambiental do governo atual tem sido associada a redução de áreas de conservação, desmanche dos órgãos de fiscalização, flexibilização de leis ambientais, anistia a quem cometeu irregularidades, defesa da caça de animais, cancelamento de parcerias internacionais para conservação, ataque às organizações de defesa do meio ambiente, corte de verbas para o desenvolvimento sustentável e, no caso recente do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, críticas aos pesquisadores que monitoram o desmatamento. Tudo isso supostamente em nome de algum benefício para a agricultura brasileira.

A conta dessa percepção já está chegando. Diversos governos de outros países têm manifestado preocupação com a política ambiental do Brasil e os custos para o planeta de uma eventual destruição da floresta Amazônica – que é brasileira, sem dúvida, mas cuja saúde é fundamental para o resto do planeta. A Amazônia não é apenas a fábrica de chuvas do resto do país e guardiã da maior biodiversidade do mundo. Também é um estoque de carbono decisivo para manter o equilíbrio do clima da Terra diante do aquecimento global em curso. Por isso, diante das declarações pró-devastação ambiental do presidente do Brasil, a revista britânica The Economist resumiu a expectativa global ao batizá-lo de “o chefe de estado mais perigoso do mundo em termos ambientais”. É como se o Brasil detivesse armas de destruição em massa ambientais. E é como se o nosso presidente estivesse sendo visto – o jogo aqui é o da percepção – como uma versão climática de Kim Jong-un, líder da Coreia do Norte.

Essa conta já foi percebida por quem faz negócios. Em uma palestra recente, Marcello Brito, presidente do Conselho Diretor da Associação Brasileira do Agronegócio, alertou para o risco de restrições comerciais caso a imagem do Brasil lá fora continue se degradando. O tão sonhado acordo do Mercosul com a União Européia pode virar cinzas muito antes da floresta. Até a China, maior cliente do Brasil, deu seu recado. A China cada vez mais se posiciona como a líder global em tecnologias verdes. O governo chinês começou a combater as mudanças climáticas por interesse próprio. O órgão responsável por comprar do Brasil já alertou para cuidarmos das práticas sustentáveis na agricultura, sob pena de embargo. Como lá é uma ditadura, nem dá para dizer que foi alguma ONG que soprou maledicências nos ouvidos deles.

O risco não é apenas para o setor agrícola. Executivos de mineradoras que operam no Brasil relatam que os acionistas vêm expressando cada vez maior preocupação com o risco socioambiental de trabalhar num país onde os cuidados ambientais estão se degradando.

É claro que não precisa ser assim. Entre 2005 e 2015, o Brasil reduziu 70% do ritmo de desmatamento na Amazônia. Foi resultado de um mix de políticas públicas como a suspensão do crédito agrícola nos municípios campeões de destruição, melhora na fiscalização e no monitoramento, criação de unidades de uso sustentável em áreas críticas como as margem da BR 163, a Cuiabá-Santarém. Sabe qual foi o impacto da redução no desmatamento para a produção agrícola do país? Nenhum. Ao contrário: nesse período, o Brasil bateu recordes sucessivos de produção e de exportação, também de geração de emprego e de crescimento econômico. E de redução da pobreza e da fome. Além disso, o Brasil ganhou reconhecimento internacional. Teve acesso à doação de bilhões de euros da Europa em programas de geração de empregos sustentáveis no Fundo Amazônia, com recursos para os governos estaduais, municipais e federais. O Brasil virou uma das grandes potências diplomáticas nas negociações dos acordos do clima, sob o guarda-chuva da ONU, que incluem não só metas mas também investimentos em obras de adaptação às mudanças climáticas e transferências de tecnologia.

O passo seguinte nesse círculo virtuoso seria buscarmos os pagamentos por serviços ambientais. O Brasil tem tudo para ser um dos grandes beneficiários dos recursos destinados para premiar quem conserva o carbono na terra. Empresas como a Permian Global captam investimentos para compensar a conservação de florestas. Há outras frentes mais ambiciosas. Novas empresas estão se organizando para remunerar os agricultores que, por meio de boas técnicas, preservam a integridade do solo e aumentam o acúmulo de carbono embaixo da terra. Uma delas, a americana Indigo, está montando um mercado internacional para pagar aos agricultores que estocam carbono no solo.

Isso sem falar nos produtos da floresta em pé. Um potencial econômico que mal começamos a explorar. A floresta preservada no Pará e na Bahia tornam o Brasil um dos maiores produtores mundiais de cacau. Se a destruição ambiental deixa um gosto amargo na boca, a preservação é doce como um chocolate.

É esse tipo de benefício que precisamos buscar. A experiência recente do Brasil mostrou que somos capazes de ser os heróis da luta global pelo clima. Mas heróis não abandonam a luta.

Este artigo foi originalmente publicado na coluna Ideias Renováveis da revista Exame.

A agricultura é aliada do clima

O setor do agronegócio pode não só preservar as florestas como reduzir o excesso de carbono na atmosfera, estocando nos solos cultivados 

É completamente falso o pretenso dilema entre desenvolvimento agrícola e preservação ambiental. Ao contrário, a agricultura brasileira pode ajudar a salvar o clima da Terra. E de várias formas – uma delas, que pouca gente conhece, deve começar a conquistar o interesse dos agricultores e empresas do setor pelo potencial de retorno financeiro. Para começar, é bom lembrar que o principal movimento da agricultura a favor do clima é fazer sua parte para acabar com o desmatamento ilegal. Nos últimos meses, graças a explosão do desmatamento da Amazônia, o agronegócio do país tem sido associado (em parte pelo apoio dado ao governo) a práticas que estimulam a devastação ambiental. Isso preocupa porque o desmatamento da Amazônia é sozinho a terceira maior fonte global de emissão de gases de efeito estufa, responsáveis pelo aquecimento da Terra. O desmatamento é a maior contribuição do país para a mudança do clima. Por causa da derrubada de florestas, que guardam carbono, o Brasil é um dos cinco maiores emissores dos gases de efeito estufa.

Não precisa ser assim. Primeiro, a agricultura brasileira não precisa de mais desmatamento. Existe o equivalente a três vezes o estado de São Paulo já desmatados e mal utilizados. As florestas derrubadas não dão lugar a cultivos relevantes para o país, mas a uma pastagem pobre que sustenta poucos bois por menos de dez anos antes de se esgotar. A área aberta e desperdiçada no Brasil é mais do que suficiente para atender toda a demanda de produtos que o país pode produzir. Ajudar a interromper esse ciclo de destruição inútil seria a maior contribuição do setor agro do Brasil para nossa economia, nossa sociedade, e também para o resto do mundo.

Mas não é só. A segunda oportunidade para o agro brasileiro ajudar a salvar o mundo é menos badalada mas pode ser bem lucrativa. Os agricultores brasileiros podem ajudar a tirar o excesso de concentração de gás carbônico na atmosfera da Terra. Como? Adotando práticas para guardar carbono no solo. Os solos agricultáveis, em todo o mundo, guardam em sua composição 1% de carbono. Esse é o material orgânico de vegetais, bactérias, fungos ou matéria decomposta. Antes da agricultura industrial esse volume chegou a ser de 3%. É perfeitamente possível fazer a concentração de carbono estocada no solo voltar aos níveis ancestrais com um pacote de boas práticas de manejo como plantio direto (que não deixa o solo descoberto), uso racional de defensivos e fertilizantes ou a rotação de culturas.

Uma startup americana, a Indigo AG, tem a ambição de impulsionar em todo o mundo essas práticas para estocar carbono no solo. A principal iniciativa da empresa é a criação do Indigo Carbon, um mercado global onde os produtores rurais podem vender os créditos pelo carbono guardado sob seus cultivos. O valor pago será determinado pelo mercado, mas a estimativa é seja entre 15 e 20 dólares por tonelada de carbono sequestrado. É um valor menor que o atualmente pago em outros projetos de compensação, mas suficiente para atrair os agricultores, que hoje estão fora desse mercado (com exceção de projetos pontuais ligados à área florestal preservada de algumas grandes propriedades).

Outras iniciativas da empresa são o Terraton Experiment, um laboratório colaborativo global, onde os produtores rurais autorizaram a coleta de dados em suas propriedades para avaliar os efeitos das melhores práticas e seus resultados no sequestro de carbono. E duas outras iniciativas do tipo competição, uma para pesquisadores que apresentam evoluções técnicas (Terraton Challenge), outra para agricultores que conseguem os melhores resultados (Terraton Cup). A Indigo está mirando no mercado brasileiro.

Para aumentar o estoque de carbono no solo, o agricultor precisa mudar suas práticas. “Mudanças significativas não acontecem aos poucos, substituindo um tipo de cultivo por outro”, afirma David Perry, CEO da Indigo. “É preciso mudar todo o sistema de plantio.” O que ele chama de “práticas regenerativas” incluem várias medidas simultâneas. “Os agricultores mais bem sucedidos serão aqueles que fizerem a transição para um sistema mais benéfico, que incorporem um pacote de técnicas: cobrir o cultivo (com árvores ou cobertura artificial), fazer rotação de culturas, não revolver o solo e aumentar a diversidade de plantios. Além disso, no caso da pecuária, fazer um manejo integrado do rebanho com a área plantada, usando os animais para enriquecer o solo. Nesta técnica, além de produzir os grãos que costuma plantar, o produtor também planta alguma gramínea para servir de pasto e inclui o gado em sua cesta de produtos.

Cada tipo de cultivo e cada região do Brasil tem uma solução específica de rotação de cultivos para deixar a terra sempre coberta, e uma camada de palha que protege o solo, afirma João Carlos de Moraes Sá, professor do Departamento de Solos e Engenharia Agrícola da Universidade Estadual de Ponta Grossa. No Cerrado, por exemplo, ele recomenda usar a safrinha de milho, após a soja, com a braquiária ou o milheto para manter o solo permanentemente coberto e proporcionar o maior sequestro.

Desde o lançamento da iniciativa, no ano passado, vários produtores rurais, principalmente nos Estados Unidos, já se inscreveram. Somam cerca de 2 milhões de hectares.

É claro que para conseguir um crédito pelo estoque de carbono no solo o agricultor precisa estar em dia com as regulações ambientais. Ou seja, precisa respeitar a regra do bioma para manter reserva legal, e manter as áreas de preservação permanente (encostas de morros e margens de rios).

Este artigo foi originalmente publicado na coluna Ideias Renováveis da revista Exame.

Foto: Crédito  Unsplash/Roman Synkevych

Seu dinheiro ajuda o clima?

As mudanças climáticas representam um risco também para os investimentos. Vários gestores de fundos já estão pensando em como proteger seu capital ­– e ajudar a financiar a economia de baixo carbono

Para quem trabalha no mercado financeiro e tem dois olhos abertos, a crise climática significa que uma grande tempestade está começando a cair. A maior que a humanidade já viu. E que os gestores de fundos de investimento estão correndo por aí tentando descobrir como proteger os 70 bilhões de dólares sob sua guarda dos raios e trovões. Essa realocação de dinheiro para se garantir diante dos impactos previstos pelas mudanças climáticas em curso terá consequências para os investidores, gestores, empresas e para a sociedade em geral.

Para ajudar nessa transição do mercado financeiro no Brasil, a Sitawi, organização especializada no desenvolvimento de soluções financeiras para impacto social, lançou no dia 16 de outubro, em São Paulo, o IPC – Investidores pelo Clima. A iniciativa visa a capacitar e engajar os brasileiros na temática da descarbonização de portfólios. Atualmente, a maior parte dos investimentos brasileiros não leva em consideração a captação de carbono e os riscos socioambientais envolvidos nos negócios; apenas os rendimentos são priorizados. Carla Schuchmann, consultora sênior de finanças sustentáveis da Sitawi, diz que o IPC pretende ajudar a mudar esse quadro. Os investidores e gestores de fundos que aderirem ao IPC ganharão por uma avaliação dos seus portfólios e terão acesso a estratégias traçadas junto a uma consultoria de como aderir à descarbonização, para reduzir sua exposição à tempestade do clima.

Esse dinheiro em busca de abrigo diante da crise climática tem um papel fundamental para acelerar a transição das economias para reduzir as causas da crise climática (diminuindo emissões de carbono) e para se adaptar ao que for inevitável (preparando a infraestrutura para os novos padrões, ou para a falta de padrões, de eventos climáticos).

As mudanças climáticas, ou a crise climática, está em curso no planeta. Suas consequências incluem a intensificação e o aumento da frequência de eventos extremos destrutivos. Tempestades, secas, ressacas. A infraestrutura atual não foi construída para aguentar a transição do padrão climático que vigorou nos últimos 2 000 anos e agora virou coisa do passado. Embarcamos num mundo novo onde não há mais padrão seguro para chuvas, estiagens, mudanças de temperatura. Até mesmo as grandes nevascas no norte dos Estados Unidos e no Canadá têm relação com as mudanças no clima. São resultado de mudanças na circulação atmosférica do Ártico (causadas pelo derretimento da calota polar). Elas facilitam a saída de grandes massas que antes ficavam aprisionadas no Ártico. Todas essas transformações e essa imprevisibilidade significam mais riscos para quem administra portfolios de investimento. Ao mesmo tempo, cresce a responsabilização das empresas que trabalham com combustíveis fósseis ou têm desmatamento ilegal em suas cadeias. Porque suas atividades estão ligadas às causas da crise climática.

Um sinal do risco para os investidores foi dado pelo Federal Reserve Bank of San Francisco. Trata-se de um banco federal que cobre os estados do Alasca, Arizona, Califórnia, Havaí, Idaho, Nevada, Oregon, Utah e Washington. Em um relatório publicado no dia 17 de outubro, o banco avisa que a crise climática pode provocar desvalorização de imóveis, que é preciso parar de emprestar dinheiro para comunidades vulneráveis a inundações e que as cidades podem perder os impostos necessários para construir proteções contra a elevação do nível do mar. Um artigo de Michael Berman, ex-presidente da Associação de Bancos Hipotecadores dos Estados Unidos, também alerta para o risco de desvalorização violenta de imóveis.

Raul Pomares, fundador da empresa de gestão de investimentos americana Sonen Capital, usa um exemplo pessoal para dar uma dimensão do risco. “Imagine que os impactos do clima não poupam nem o Vale do Silício, uma das áreas com maior concentração de riqueza e tecnologia do mundo”, dele diz. “Eu passei quatro dias sem eletricidade em minha casa numa região ao norte de São Francisco por causa de um blecaute gerado pelos incêndios florestais”, conta. Os incêndios de proporções inéditas que varreram a Califórnia foram associados à estiagem recorde que atinge a costa oeste americana, um dos efeitos das mudanças climáticas em curso. “Os incêndios e o blecaute geraram bilhões de dólares de prejuízos para as distribuidoras de energia da região.”

A especialidade da Sonen é criar e aplicar soluções para medir e reduzir o risco de portfolios de investimento à crise climática. Também ajudam a dirigir investimentos para fomentar a economia de baixo carbono. Será preciso repensar os critérios de segurança e retorno financeiros dos investimentos para se adaptar à instabilidade do clima. Também para ajustar os investimentos para melhorar a infraestrutura e apoiar a mudança para uma economia mais segura, que evite os piores desastres para a sociedade e para a natureza. Isso significa reduzir as atividades que causam a crise.

“Muitos investidores acham que para investir em negócios bons para o clima é preciso ter tolerância ao risco e liquidez bastante para apostar em novas tecnologias limpas revolucionárias”, diz Pomares. “Mas existe uma carteira enorme de oportunidades de investimento tradicional que também são a favor de segurança climática”, afirma.

Essas oportunidades envolvem a modernização de centrais elétricas, promoção de eficiência em transportes, manejo de lixo e resíduos (para reduzir emissões de metano), reflorestamento, ações para evitar desmatamento. Isso sem falar em obras de adaptação como reformas na infraestrutura de cidades, estradas, portos etc. para lidar com secas e chuvas fora do padrão, além do avanço do mar.

Esse cuidado de proteger os recursos da crise climática também está ao alcance do investidor individual. “Tenho colegas que deixaram de investir em fundos que não se preocupam com o clima”, afirma Carla. “Em alguns casos, se o agente diz que parte da taxa de administração vai para projetos verdes, esses clientes mais exigentes não acham bom o bastante”, diz. Afinal, o conteúdo da carteira de investimentos continua o mesmo, sem diferenciar quem tem maior ou menor risco climático e quem está contribuindo para a economia de baixo carbono. Se preocupar com o futuro não deve ser exclusividade dos profissionais do mercado. “Investidores de grandes fundos e gestores de produtos estão pensando nisso. Cobre você também”, aconselha Carla.

Este artigo foi publicado originalmente na coluna Ideias Renováveis da revista Exame.

Foto: Tempestade no interior da França. As mudanças climáticas trazem alterações perigosas nos padrões de eventos extremos, como as chuvas destruidoras ( Thomas Bresson/Flickr. Legenda)

As soluções do Hacking Rio

Na maior maratona de desenvolvimento de software do Brasil, jovens inventam novas maneiras de cumprir as metas de desenvolvimento sustentável

Como a tecnologia pode incentivar comportamentos e estilos de vida sustentáveis? Essa foi a pergunta que norteou o desenvolvimento de um game para coleta sustentável inteligente. O jogo foi desenvolvido usando uma placa de arduíno (material usado em robótica). A ideia é compensar quem deseja fazer a destinação correta de seus resíduos. Com o game de coleta sustentável, pensado para ser usado em eventos diversos, uma pessoa consegue informar por meio de QR Code que está separando seu lixo reciclável e o depositando no local correto.

Em seguida, o número de materiais destinados à reciclagem é contabilizado e revertido em pontos. “Os pontos, então, podem ser trocados por produtos de empresas parceiras ou serviços que estejam sendo oferecidos em determinado evento”, diz Shirley Nunes, estudante de Engenharia de Produção da Universidade Veiga de Almeida, no Rio de Janeiro, uma das criadoras do jogo. “Se for um evento de games, quem reciclou x número de latinhas de refrigerante pode ganhar 30 minutos gratuitos para testar qualquer jogo, por exemplo. É como se estivéssemos colocando dinheiro em uma carteira virtual de quem recicla”, explica Shirley.

Shirley e seus colegas de equipe criaram o jogo numa competição, o Hacking Rio 2019. O jogo, batizado por eles de Fun Collect, ganhou o primeiro lugar na categoria Sustentabilidade & Oceanos. Com o sucesso da iniciativa, eles agora sonham em abrir uma startup para viabilizar o projeto. Seu sonho é bem realista. Afinal, o Hacking Rio, que aconteceu entre os dia 18 e 20 de outubro, na região portuária do Rio de Janeiro, é o maior hackathon do Brasil. A iniciativa visa exatamente juntar jovens talentos para responder a desafios propostos pelos organizadores (e pelas empresas patrocinadoras). Os jovens aplicam seus conhecimentos de programação, design e negócios para pensar numa solução inovadora. Depois viram o fim de semana montando um protótipo do projeto.

Um hackathon é um dos melhores lugares para presenciar a capacidade dos jovens brasileiros para encontrar soluções criativas e economicamente viáveis para os principais problemas do país. Inclusive os grandes desafios de sustentabilidade. O Hacking Rio é um evento privilegiado nesse aspecto. Foram 990 jovens inscritos para os desafios este ano. A competição de 42 horas teve o objetivo de desenvolver novas tecnologias capazes de solucionar também problemas como os de mobilidade, segurança e saúde. Uma das novidades do Hacking Rio é que os desafios estavam relacionados ao cumprimento dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, os ODS.

Esses objetivos organizam os grandes problemas sociais e ambientais do mundo – e do Brasil – como acesso a água potável e saneamento, redução da pobreza, fim da fome, energia para todos, educação e saúde, equidade de gênero etc. “Os ODS ajudam a orientar quem quer pensar em soluções para resolver os problemas do país, que também criam oportunidades de negócios’, diz Lindália Junqueira, realizadora do Hacking Rio.

Se alguém precisasse de inspiração, bastava olhar pelas janelas panorâmicas do 18º andar do prédio onde se reuniram os desenvolvedores participantes. A vista de 360 graus revelava toda a complexidade ambiental e social do Rio. De um lado, a Baía de Guanabara, poluída, com todo seu potencial de turismo e de transportes, navios de carga e de exploração de petróleo. De outro, a cidade com suas favelas conflagradas pela violência, vulneráveis às chuvas, pulsando com gente empreendedora, as ruas congestionadas pedindo melhores soluções de transporte e, ao fundo, a beleza do Pão de Açúcar e do Corcovado.

A possibilidade de resolver problemas reais – e criar negócios economicamente viáveis – é o principal atrativo para os participantes. O analista de sistemas carioca João de Souza, de 30 anos, foi ao Hacking Rio e começou a desenvolver uma solução para identificar vazamentos de petróleo a partir de sensores instalados nas bóias do oceano, capazes de assinalar a presença de gases associados ao óleo na água. A ideia surgiu lá mesmo.

João vê no hackathon uma oportunidade para pensar em problemas da sociedade e não apenas dos clientes que atende. “Quando você está atendendo o cliente, em geral trabalha com rotinas de procedimentos pré-estabelecidas”, diz. “Aqui não. São problemas novos. Não tem solução pronta. Você precisa mergulhar no assunto na vida real, estudar química dos oceanos, comunicação em alto mar ou rotas de navegação.” Seu colega no desafio é o empresário Danilo Freitas Rangel, de 28 anos, de Campos dos Goitacazes, no norte do Estado do Rio.

Dono de uma empresa de moda, ele acredita nas oportunidades para criar softwares capazes de resolver problemas de mitigação ou monitoramento de desastres ambientais para a indústria do petróleo. “Eu queria ter a satisfação de montar um negócio baseado em tecnologia para resolver desafios ambientais”, disse. “É por isso que vim para o Hacking Rio.” Essa expectativa reúne quem está no hackathon. “A tecnologia pode resolver grandes problemas ambientais de forma rápida. E ainda por cima gerando negócios viáveis”, diz Ana Luiza Mathias, diretora da Choice, uma iniciativa que orienta os jovens a resolverem problemas socioambientais. Ela estava como voluntária no Hacking Rio para orientar a área de desafios de sustentabilidade.

A concentração de gente com vontade de inovar interessa aos empresários com negócios baseados em soluções tecnológicas para problemas ambientais. Foi por isso que a empresária Wilsa Atella se voluntariou para ser uma das mentoras da área de desafios de sustentabilidade do hackathon. Ela é dona da Ambidados, uma empresa do Rio especializada em sistemas de monitoramento do oceano, com clientes na indústria naval e no setor de óleo e gás.

Seu interesse é desenvolver tecnologias locais, focadas nas características ambientais e na infraestrutura do Brasil. Wilsa circulava por entre as mesas dos grupos do Hacking Rio dando orientações técnicas e de desenvolvimento de negócios. Ao mesmo tempo, ficava de olheira, avaliando possíveis grupos com ideias promissoras para seu próprio negócio. No ano passado, quando participou de outro hackathon, interessou-se pelo projeto de um grupo que desenvolveu um sensor para medir a intensidade das ondas usando uma técnica inovadora, que tornava o equipamento mais simples, resistente e barato.

Terminada a competição, ela fez uma parceria com o grupo, aperfeiçoou o aparelho dentro de sua empresa e lançou o sensor como um produto próprio no início deste ano. Diz que já tem clientes para ele. A equipe que desenvolveu ganha um percentual das vendas. “Agora estamos pensando num modelo que funciona como alerta para piscinas. Ele vai disparar um alarme se alguém cai na água e pode ajudar em acidentes com animais ou crianças, por exemplo”, diz.

Este artigo foi originalmente escrito por Alexandre Mansur e publicado na coluna Ideias Renováveis da revista Exame.

Foto: Equipe vencedora do desafio de sustentabilidade do Hacking Rio: número de materiais destinados à reciclagem é contabilizado e revertido em pontos (Foto/Divulgação)